A Melhor Idade, 1ª Parte.

"O Poodle e o Velho: o primeiro comporta-se como uma criança. Por isso é amado. O segundo, para tentar ser amado deve comportar-se como uma criança. O Poodle é mais feliz?"

É a solidão de um banco no Asilo,

o frio almoço no restaurante por kilo,

o cão que substitui o ausente filho

e o inútil retrato, há tanto sem brilho.

Nova geração tomou-lhe o lugar, velho.

Sinta escondido o que te permitirem de saudade.

Atributo do caricato abandono da melhor idade.

Agora, o que te espera é só a espera.

Flores viraram hera

nesse outono jardim, pós primavera.

Dia após dia te farão fingir alegria.

Roubar-te-ão aquela doce nostalgia

e te proibirão o exercício da melancolia,

pois pouco sabem de tuas noites. Menos do dia.

Antes que dos crepúsculos

viste o fim dos músculos.

Foi quando compreendes-te o quão minúsculo

foi o imaginado luzir.

E, ainda assim, obrigar-te-ão a sorrir.

E parido, vivido e excluído, resta-te ir.

E por que tudo existiu?

Por que tanto mar sem navio?

Se o fim era predestinado,

por que tanto errar errado?

Mágoas remoídas,

ausências sentidas

e nenhuma despedida

nessa quase hora da Partida.

"C'est la vie, petit garçon".

Findou o frisson

da chuva na noite marron.

E das poças de gáz neon.

Amores sentidos,

tesouros perdidos,

orgulhos feridos

e agora? Só trechos desses tempos idos.

Mas venha velho. É hora de morrer.

De tudo esquecer,

de tudo enterrar

na cova rasa de algum lugar.

Mas antes, veja: há quem espera teu perdão.

Conceda-lhe esse alívio na consciência.

Esqueça tua própria carência e alivie o coração.

Nada lhe custará.

Irás mais leve para algum lugar.

Ainda que seja para o só Não Estar.

Cumpriste teu destino.

Morto está, anuncia algum sino.

A paróquia chora,

mas pelo adiantado da hora,

logo tu será só mais um

que o Bom Deus levou embora.

Prossigam o baile . . .