Lapsos

Aos vinte anos foi-me permitido sonhar.

Mas agora as memórias tomaram o lugar dos planos

e o corpo me revela os danos dos anos.

Foram ingênuas as tantas expectativas.

Delas, sobrou-me um vaso de "sempre-vivas".

Somos as nossas histórias,

lembranças e lapsos

nesse tempo inerte e relapso.

Do fogo das paixões restou um triste mormaço.

Do vigor do rigor, percebe-se apenas um leve traço.

As rotas do ouro e as ruas de aço

tornaram-se empecilhos e laço.

Sinto o tremor nessa mão que finda o braço.

Essa epilepsia de nunca se aquietar.

Temo o dia em que se me paralise o passo

e sinto a dor desse Câncer que me devora

nesse tempo que é só agora.