Canga
Quando tinha a tua idade, moça,
sempre me diziam, ouça:
a vida é uma cangalha;
cuidado, vive-se no fio da navalha.
Navalha de Ockam.
Reduza qualquer afã,
em busca do máximo resultado.
Mantenha o arreio bem apertado,
aceite o jugo do Poder
e não queira qualquer querer.
Contudo, eu cria que a cerviz não se dobra.
Nunca aceitei ser massa de manobra
e por isso, do banquete só comi a sobra.
Mas agora morro leve,
o Inferno foi-me breve.
Por isso te digo:
passeie como "mulher da vida"
com cara de pecadora arrependida,
incerta e dividida
entre o prazer e a lida.
Faça com que o jugo que te for imposto,
seja apenas um vestido de mal gosto.
Uma canga que lhe incomoda,
nesse carro fora de moda.