DEBAIXO DA MINHA PELE
signos, símbolos, sinais
sintético, simetria
alguma sinfonia?
alguma sintonia?
dissonantes acordes!
discordantes sonoridades!
a minha vida em símbolos
esperanças em reticências
numerosos algarismos
que me nomeiam
sou meus dados cadastrais
( e meus desejos passionais?)
minhas bandeiras, onde as guardei?
quando penso que penso
sou apenas resultado de
tudo que me ensinaram,
reflexo das verdades alheias
gravadas em formas fixas.
Vou fazer recadastramento
vou apagar esta sopa de letrinhas
e números e distintivos, vou
despir esta camisa bordada
de infâmias e diretrizes
e ler somente a minha pele
as linhas da minha mão
lembrar das histórias ouvidas
à luz do velho lampião...
mergulharei no lago do esquecimento
jogarei essas tralhas ao vento
da janela do meu lindo apartamento
lindamente decorado de futilidades
e contaminado de noites de insônia
da dolorosa maciez da minha cama
que não me traz o conforto da alma.
Vou fazer recadastramento,
sentir o prazer do dever cumprido
preenchendo formulários
e com muitas louças e objetos
superlotando os armários...
ir à feira ecológica aos domingos
um culto ao verde, comida saudável
belo quadro de natureza morta...
preciso urgentemente
olhar pra mim mesma
e descobrir em cada palmo
da minha pele
o território perdido
que se esconde
sob sua guarda...
abismos profundos
silêncios
convergências
esplendores
fogueiras
olhos ardentes
abrandamentos
óleo escorrendo sobre a ferrugem
lavando as carnes retorcidas
bálsamo pensando as feridas
candeeiros , lumes, clarões
nas entranhas redesenhadas...