Madrugada

Uma hermenêutica notável faz-me habitar o vidro das imagens.

Na inconsciência do dia, os fragmentos do vento

inundam a natureza com o seu hálito frio. Num aceno

voluntário, descubro um firmamento de estrelas inventadas;

Sobre a terra, a noite vegetal inicia a viagem insidiosa da

obscuridade. E criamos deuses enquanto adormecemos

com o eco dos olhos velados pelas pálpebras. Estendes os

ombros, sinto as margens do sangue na planura universal;

Uma hermenêutica notável faz-nos habitar o reflexo dos

vidros. A linguagem invisível dos ciprestes e mesmo a esverdeada

água que escorre das estátuas são o palco duma

apoteose cinematográfica. Lâmpadas próximas do som das aves;

Descubro o rosto feminino da madrugada concentrado

no meu rosto absorto e, com o lirismo lunar por espectáculo,

escuta a melodia incólume das veias;

Sinto o sangue nas margens da planura.

Os jardins de onde viemos com as aves agora desertos

como nós em todos os vidros.