A cidade e o campo
Eu a pensar no vasto conhecimento de Jacinto
Nos seus livros
Máquinas que substituem homens
Nos seus jantares para o grão-duque
Na sua completa agenda social
E no seu encanto pelo fervor da metrópole Paris.
Eu a pensar na sapiente ignorância de Zé Fernandes
Nas suas serras
Mãos humanas a cultivar as videiras
Na sopa dourada de sua tia Vicência
No livro de Direito Civil esquecido na biblioteca
Nas horas e horas a contemplar as campinas
E no seu encanto pela paz
Que transbordava nos campos.
Eu a pensar na ilusão das cidades
No sofrer manso das fazendas
Nos andaimes que chegam mais perto do céu
No dia-a-dia
Nas colheitas que se tornaram parcas
E para poucos, ano-a-ano.
Eu a pensar na loucura dos transeuntes
Num clamor de abundância e desespero
Num grito calado de conhecimento e ignorância.
Eu a pensar na devastação de tratores
Que ungidos por coronéis de sesmarias
Retorcem e escavam os sulcos da terra
Envenenando-a com herbicidas criminosos.
Eu a pensar na ilusão de Jacinto
Eu a pensar na ilusão de Zé Fernandes
Outrora personagens da cidade e das serras
Hoje, fuligens na vastidão do ar
Eu a pensar...