SÃO PAULO ABCDÁRIA



Das fábricas de São Paulo
Sai um cheiro estranho
E inusitado.
Não é fuligem, enxofre, gasolina, óleo, álcool,
Solvente, celulóide, lixo, asbesto,
Carboneto nem dioxana.
Também não há poluição
Posto que o produto em questão
Está sendo estocado
Confinado
Empilhado
Dia a dia, sempre mais.

O cheiro que se percebe
É um composto único
Que se desprende ao apito das fábricas,
Que ainda geme mas agora de aflição.
O verde, disso não morre...
Mas assiste boquiaberto
A este organismo que pulsa em agonia
Expelindo estranhos gases.

O cheiro que das fábricas escapa
É da carne abatida
Dos homens que lá trabalham.
No ar, o odor típico das feridas,
Sem curativos de mercúrio-cromo...
Chagas abertas sob o céu de trevas
Desta
São Paulo ABCDária.

         S

M a t a d’o u r o
         c
         r
         i
         f
         í
         c
         i
         o

        


jan/ 1981
 
KATHLEEN LESSA
Enviado por KATHLEEN LESSA em 29/01/2006
Reeditado em 25/05/2014
Código do texto: T105476
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