Depois da ida
Poderia ter ficado em silêncio na noite que você não veio.
Talvez, quem sabe, olhar o céu e procurar alguma estrela
Ou até ver um filme sem muito sentido e me perder nos comerciais.
Mas não.
Não fiquei em silêncio.
Falei às paredes o que me corroia o sangue, transformando-o em água
Água límpida? Não. Uma água salobra, fétida, corrosiva,
Da cor do ácido sulfúrico. Azul claro, esverdeado até.
Falei por horas até que não me sobrasse voz
E continuei falando apenas em sopro de vento através da janela fechada
Os sentimentos batiam no vidro, voltavam trincados, doloridos
Como quem foge da guerra sem ter parada a não ser no peito do inimigo.
Dormi meio mal dobrada entre lençóis e travesseiros
Sonhei com cheiros, gostos, e tantos pontos de interrogação.
Acordei no dia seguinte
Ainda pesada, cansada como quem carrega o mundo nas costas
Amanhã, talvez, ainda pese
Só que agora, abri as janelas
E os sentimentos tristes voam soltos
E se desfazem no ar... como a fumaça do meu cigarro.