Pintura
Sonhei com um bonito quadro.
Nele havia pinceladas escuras
de redes de dormir
pareciam de nylon
e eram muitas.
Atravessadas.
Apertadas.
Sufocadas.
Em um quarto.
Ao fundo da tela
destacava-se uma porta
ou uma janela.
Aberta.
Parecia lua cheia
a fresta de luz que passeava
pelo quarto
era de azul prateado
ou azul-violáceo
índigo, talvez
não sei,
se fosse pintora saberia.
Havia além uma flor
em algum lugar da tela.
Perdida. Murcha. Amarela.
Em um jarro ou na janela.
Sim, era mesmo uma janela
e era maior que a própria noite.
Não possuía ninguém nas redes.
Todos lá fora.
Nos barcos, talvez.
Não existiam barcos no sonho,
nem no quadro.
Deduzo porque a pintura
tinha cheiro de mar
e as redes me pareciam rendidas
aos corpos de sal
dos pescadores
que lá fora
pescavam a noite
e descobriam os peixes com suas técnicas.
Por falar em técnica,
não sei de qual era feita a tela
se fosse pintora saberia
uma pena
ser poeta.