MESTIÇO

Surgido quase do nada

por capricho do destino,

hoje sou guasca andarino

deste pampa nobre e altivo,

sou também xiru cativo

deste meu querido pago,

pois para mim qualquer trago

sempre me foi lenitivo!

E do que mais eu me orgulho

é ser um gaúcho serrano,

tenho um santo soberano

que trago no meu pescoço,

em canchas de jogo-de-osso

é meu velho protetor. ..

Também nos causos de amor

me ajudando no retosso.

Tenho um Deus de minha crença

o Patrão Velho do céu,

e o meu tão rude sovéu

que quando pialo se empina,

tenho por Deusa uma china

companheira mui adequada,

que escolhi para a jornada

quando eu for pra outra campina.

Minha cruza sei que é braba

eu sou um pouco nativista,

sou cria de raça mista

fui criado com paciência,

curtido pela inclemência

do velho sol do meu pago,

e comigo eu sempre trago

supremo amor à Querência!

Sempre tive por guia o sol

e o grito da saracura,

tomo banho em água pura

sempre ando por onde quero,

e para ser bem sincero

eu guardo com devoção,

muito amor, muita afeição

ao gaudério quero-quero.

Fui a princípio maragato

criado quase pagão,

depois, conheci a oração

por padre em negra batina,

entrando pela campina

catequizando de flanco,

irmanando índio a branco

entoando Canção Divina!

Desde então tenho sofrido

por minhas grandes mudanças,

já fui guasca de lambanças

amigo dos araganos,

que vivem fazendo danos

andejos como perdiz,

hoje resta a cicatriz

tropa velha, de outros anos.

E hoje estando apartado

do meu pago onde nasci,

canto como banteví

que ninguém lhe dá tenência,

sofro muito pela ausência

da chinoca e o chimarrão!

Dos causos lá do galpão

em noites frias da querência.

E cura sei que não tem

para a dor que agora sofro,

só quero sentir o afofo

da carícia de algum trago,

quando este MESTIÇO vago

sentir a morte que passa,

hei de quebrar a carcaça

lá num canto do meu pago.

Tapejara Vacariano
Enviado por Tapejara Vacariano em 06/08/2014
Código do texto: T4911744
Classificação de conteúdo: seguro