A RUBENS DARIO SOARES

Conhecia-te de nome

Desde o ano sessenta e seis,

Quando, não lembro o mês,

Apareceu em Vacaria,

Um taura com fidalguia

Falando-me nos teus versos,

E declamou-me diversos

Exaltando-te com alegria.

E o teu CÂNTICO DOS PAGOS,

Reli do início ao fim,

Despertando aqui em mim

Um sentimento bagual,

No cocho do lambe sal

Do teu rodeio mui ordeiro,

São versos bem campeiros

Comparado não tem igual.

Li com atenção o prefácio

Do grande Eurides de Castro,

Curioso seguindo o rastro

Na BODEGA DO JERÔNIMO,

Parei assim meio anônimo

Pois senti aqui no gargalo,

O gosto e o estranho pealo

Da canha e já saí de arrasto.

Que arrojo, que exuberância,

Naquela bodega caiada,

Canto a canto enfeitada

Pras festas de fim de ano,

Quanto guasca irmano

Não deixou ali a medida,

Por falas mal entendidas

Entre maulas e paisanos.

E no teu AMARGO mui guasca

Com buena erva de Palmeira,

Senti na goela a coceira

D’água quente, que descendo,

Todo meu ser foi absorvendo

Assim como por encanto,

Auscultei em mim o pranto

D’água da chuva correndo.

Nesta emoção incontida

Tua nobre EXALTAÇÃO,

Ramificou com razão

Meu lado sentimental.

Reverente, sem igual,

CHASQUE A SÃO PEDRO fizeste,

Onde volteando tu viestes

Mostrar: serás imortal!

Com entono e fidalguia

A fibra que se expande,

Mano, VOLTEANDO O RIO GRANDE

Vi um carreteiro incrú,

Vi em seu olhar de chiru

Uma união de gente e mundo,

Transcendendo no seu fundo

ASSIM MORREU TIARAJÚ.

Quantas saudades eu tenho

Da minha estranha vivência,

Porém, revi na QUERÊNCIA,

Toda a vida do meu pago,

Esta tristeza que trago

Espalhou-se como poeira,

Deixando junto à porteira

O até breve do índio vago.

Na velha TUMBA DE HERÓIS

Numa homenagem bagual,

Tu retrazes sem igual

O que fizeram os cueras,

Recruzando pelas eras

Numa louca disparada,

Indo sestear na ramada

Do velho UMBU DA TAPERA.

No MEU RIO GRANDE DO SUL

Boleei a perna e apeei,

Meu pingo desencilhei

E fui arrastando a picanha,

Para um trago bom de canha

Cheguei ligeiro ao balcão,

Olhando irmão por irmão

No BOLICHO DE CAMPANHA.

Olhando o GALPÃO DE ESTÂNCIA

Senti uma estranha SAUDADE,

Aqui no meio da cidade

O viver é diferente,

No fundo d'alma se sente

Como um CARRETEIRO ao léu,

Pilchado, mas sem chapéu,

É rio a morrer na nascente.

Nas RIMAS DO MEU RINCÃO

Renasceu o pago pra mim,

Esta minha ânsia sem fim

Parou na tua EVOCAÇÃO,

Como bagual redomão

Pateando o descampado,

Vivendo sem aramado,

Sem marca e sem patrão.

No MEU CUSCO recordei

Com tristeza e amargor,

Pois, amigo campeador,

Eu tive um - que amizade! -.

Mas uma alma sem piedade

Envenenou o meu cão,

Até hoje meu coração

Vive a chorar de saudade.

Guapa OFERENDA CRIOULA

Ao teu amigo Olívio Rocha,

Sinto que és a grande tocha

Da ciência campechana,

CHIRU VELHO, que irmana,

Ao peão, o patrão e perdura,

Na mesma linguagem pura

Rara virtude haragana.

E na TAPERA retratas

Misto de amor terra-chão,

Em democrata reunião

De saudade e sofrimento.

E "O CENÁRIO", que portento,

Relatas o pago santo,

Uma coisa eu te garanto

É mais lindo paramento.

E no TERRA MISSIONEIRA

Li o prefácio mui atento,

É um macho rebento.

Zalmon, grande vereador,

Plainando como condor

Os ares do céu aberto,

Falastes pouco, mas certo,

De tua fibra e teu valor.

Na sua NOITES DO PAGO

O prefácio retribuístes,

Como canário no alpiste

Alegre e mui cantador,

Descrevestes o cantor

Num auto-retrato franco,

É tinir de ferro-branco

Em ranchos e corredor.

Na MINHA TERRA lendária

Renasci desde mia infância,

Ali já sem arrogância

Reverenciei sem alarde,

O amor da china que ainda arde

Desde o meu primeiro dia.

Quero ouvir a "Ave Maria"

Mateando num FIM DE TARDE...

VELHO RIO GRANDE imortal

Pelas charlas galponeiras,

Dessa terra, as bandeiras,

Se nos representam tudo:

O ginete macanudo,

CHINOCA nos acenando;

É meu corpo recordando

Dum amor mui topetudo!

As fantásticas visões

VÊM DE LONGE eu bem sei,

Quanto recuerdo esperei

Num LAMENTO GUASCA doído

Ainda sinto até gemidos

Do minuano mau, passando,

Como um vendaval levando

Tudo o que eu tinha erguido....

Nas NOITES DE MEU SANTIAGO

Ao CTG Coxilha de Ronda,

É uma ode que estronda

A tudo ali representado,

É UMBU ramificado

Dando pousada e guarida,

Aos tropeiros que dão vida

A esse pago idolatrado.

Encilhei o pingo matreiro

VELHO TRASTE de valor,

Topetudo cantei "flor"

Num adeus abanei o pala,

Meio assim como uma bala

Eu fui certo no que vi,

Saudei a CANÇÃO GUARANY

Porque ao solitário embala...

E o VELHO RANCHO crioulo

Que muito abrigo me deu,

Ainda não apareceu

Ninguém, que iguale sua estampa,

O passado que destampa

Sua índole e simbolismo,

Estranho primitivismo

Eu vejo, em VISÕES DO PAMPA.

Hó! LENDÁRIA TERRA GAÚCHA,

Passado, agora e futuro,

Eu vivo sempre em apuros

Dando vazão ao progresso,

Mas o estranho retrocesso

Que na carne hoje se sente,

DOS FOGÕES GAUCHESCOS, gente,

Que vive do pago egresso...

Ao SOL POSTO os quero-queros

Revoando fazem silhuetas,

Como clarins e cornetas

Que tocavam o "avançar",

Sempre prontos a pelear

Em defesa da coxilha,

Minha macha alma caudilha

Como ÍNDIO VELHO a matear.

SINFONIA DA TERRA fala

Na mulher de vida airosa,

A chinoquita formosa

É CHIMARRÃO repolhudo,

Que parecendo a um veludo

Quando passamos a mão,

Aflora à imaginação

Ânsias de fazer de tudo.

Grande Sepé TIARAJÚ

HERÓI MISSIONEIRO, cantas,

Com corcovos da garganta

Que se abrindo ao descampado,

Vão sulcando como arado

A terra crioula da alma,

Neste momento com calma

Vejo um lunar estrelado.

Querência é ÍNDIO VAGO,

Sem afetos e ilusões,

Que cruzando os picadões

Atalhos e corredor,

Vai sempre cantando "flor"

No truco macho da vida,

Remoendo n'alma vivida

MINHA CANÇÃO INTERIOR.

Ainda trazes nas ventas

O cheiro do pago criança,

RECUERDOS, mais esperança

Dum futuro promissor,

Como o bravo lavrador

No coice do arado macho,

CIRANDA DE VERSOS eu acho

A fina flor do cantor.

À memória de tua mãe

A CANÇÃO INESQUECÍVEL,

Nosso pago invencível,

De orgulho, de Tradição,

Bateu tição com tição

Numa vaidade haragana,

Em SINFONIA PAMPEANA

Cantas, o macho torrão.

GUARDA FOGO luminoso

A Isaltino de Carvalho,

Brasas do mesmo borralho

Cinzas do mesmo fogão,

Bato tição com tição

Sem querer fazer intriga,

Saúdo, pois a ÚLTIMA BRIGA,

Ouvindo a voz do rincão.

Adauto Mastela Basso

Ao poeta e amigo do peito,

Num POENTE com muito jeito

Cantas a alma tapejara,

Um sonho que findara

Na potreada ao querer bem,

A Albery Castro também

Uma NOITE crioula ofertara.

Sempre solto e SEM CABRESTO

Autobiografia haragana,

É pestana com pestana

Que batidas com coragem,

Numa gauderia homenagem

Doutor Lauderites Ramos,

SUPREMO SONHO evocamos

Em macha camaradagem.

Amambaí-MS, 22 de outubro de 1974.

Eu te invejo amigo Rubens

Aqui do Oeste do Brasil,

Desejo grandezas mil

A ti e teus ente queridos,

Que sejam todos varridos

Pela vassoura Divina,

A nossa velha campina

Onde ambos fomos nascidos.

Pesso escusas pelo atraso

De teu chasque responder,

Porém, quero agradecer,

A humildade em "permissão",

- Com toda a alma e coração -

Para editares meus versos,

Tão pobres gados dispersos;

Dou-ta, de primeira mão.

Que orgulho me assoma agora

Fraco contador de estórias,

Ser parte de tuas memórias

Que pretendes editar,

Por isso quero saudar

Em linguagem de tropeiro,

O expoente missioneiro

Rei da arte de versejar.

Aguardo com ansiedade

A promessa do amigão,

Teu livro: FOGO DE CHÃO

Pela crítica elogiado,

Tenho na estante guardado

Um lugar para o rebento,

Será o glorioso tento

Pro meu rebenque trançado.

Velha Uruguaiana lendária

Berço guasca do amigaço,

Pois neste momento eu faço

Corcoveando de emoção,

Homenagem ao fogão

Que esquenta com angico;

Até logo do milico

Saudoso de nosso chão.

Amambaí-MS, 25 de maio de 1975.

Depois de vinte e um anos

Aos nossos chasques volto,

E mais do que antes me solto

No potreiro da amizade,

Mate da hospitalidade

Passo-te, com erva buena,

Mas, já sem o ar de torena,

Que perdemos com a idade.

Meu potreiro está mudado

Pois o gado espavoriu-se,

Até meu cusco sumiu-se

Com a falta do sustento,

Já não lonqueio mais tento

Porque a faca perdeu o fio,

A vela está sem pavio

Escureceu o pensamento.

Um dia, se Deus quiser,

Chegarei no teu rancho,

Sem convite, de carancho,

Pois o imprevisto adoro.

Sou bem breve, não demoro

Nas visitas que faço,

Por gostar do meu espaço

Eu respeito onde não moro.

Tapejara Vacariano
Enviado por Tapejara Vacariano em 30/07/2014
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