Romance do Picasso frente aberta
Ontem era potro de estouro!
Agora puxa papel e papelão.
Que fica ate com marca de cincha, no couro
E nem tem mais galpão.
Agora anda pelas ruas da cidade
Que não tem espaço para ti.
Que vai puxando carreta, pedindo por caridade,
Que às vezes lhe sobra alguma mancha pasto, por ai.
Agora atado num canto do povoado
Nem parece, aquele potro bueno.
Que saiu dos meus bastos, agora judiado
Sem pasto, com um ferimento aberto, coberto com um pano.
Lembro-me quando chegas-te...
Foi o Picasso frente aberta mais lindo.
Que fui domando com tempo, ajeitando-te
Pelo largo do campo às vezes com a lua sorrindo.
Tocava boi pela costa do lajeado.
Encurtava a pega de potro gavião.
Tudo isso ainda de queixo atado.
E tinhas um galpão!
Mesmo redomão já se mostrava sereno
Bueno e ordeiro pra basto e também os tiros de laço.
Que bueno de tranco, fazia o mundo pequeno
Ao encurtar o espaço no destino certo do braço.
O Picasso frente aberta, bem domado.
Mas domador não se governa.
Ajeitei e entreguei o Picasso pra o patrão calado.
Que nas suas patas ouvia rezar uma novena.
Pra não ir, pra o povo, em destino maula.
Mas a tropilha foi entregue e levada pra outro lado.
E o potro mais bueno e mais taura...
Foi Cambiado na linha, por primeiro pra o delgado.
Que pensei comigo um dia, ao ver;
Ele nos bastos do delgado, bem encilhado.
Mas depois de bem manso e bem domando foi fazer,
Uma diligencia, pra pega um bandido no povoado...
Que rodou com o delegado! Que vendeu.
E não mais vi aquele Picasso frente aberta.
Somente, soube que tinha ido pra banda oriental, e sumiu.
E no mais pensei comigo, que virou pingo de estância.
Mas um dia, a triste visão pra um domador!
Ao ver o potro bueno, de sua rédea.
Jogado, sem galpão e com dor.
Puxando papel e papelão, sem a real serventia.
Conheci o Picasso frente aberta.
E ele me reconheceu no mesmo ato.
Olhou-me e se engalanou abrindo a venta.
Eu que vinha pra o povo, sofrenei na cerca no costado.
E vi a cena, tórrida, triste pra um domador!
Ao ver um pingaço, magro e judiado.
Vi nos seus olhos como se falasse, me soltem, por favor.
Sai já com o pingo puxado, atado na cincha perguntando.
Que é do no deste cavalo?
Que compro, por qualquer preço porque gostei do pelo.
Um guri já me falou que o dono ia matá-lo.
Que era louco em compra esse cavalo, que já não guentava o lombilho.
Que logo o dano saiu e me disse...
-Pode levar esse lixo, não serve pra nada este caco!
Mas quero pagar e antes que pedisse preço, e desdissesse
Paguei pelo cavalo e levei de volta pra o campo.
Tratei, curei, ajeitei denovo da boca, porque que tava meio louco.
E depois de um tempo voltei com flete, bem montado.
Que voltou ser pingaço de estouro, de pexa touro!
Que parou o povo ao ver o pingo denovo bem encilhado.
Que voltei e parei pra mostrar o potro
Pra quem iria matá-lo.
Que nem reconheceu, e me disse que era um flete de ouro.
Ao ver a rédea, que pagava qualquer preço, para telo.
Respondi com clareza e firmeza:
Cavalo bom, não tem preço!