INVERNADA DE SAUDADE
Manhã cedito quando o sol ia despontando,
apertou o peão a chincha no pingo malhado.
Lépido, boleou a perna e saiu campo a fora,
amargando grande dor pelo amor truncado.
Em longa viagem a querência ia cortando,
dias em frente, sempre, sempre galopando,
olhos parados, pois índio macho não chora,
ainda que esteja doendo o peito machucado.
Nada mais do que um baita amor finado,
deixa um gaúcho de todo apoquentado.
Mano a mano apostado com o sentimento,
o qüera sofre como se da vida um manotaço,
num repente, fortemente o tenha apealado.
E lhe dói sem reagir, ser assim pego a laço,
deixando seu coração no maior tormento
p´ra bater a cada momento com embaraço.
Depressa, mas sem descanso, vai andando.
E o sol vai doirando ao longe os horizontes.
No peão vai arrefecendo no peito amargurado,
o vigor, dobrando a altivez do guasca largado,
que agora busca nos confins outros repontes,
com a flor do amor no peito dia a dia apertado,
tendo certeza que não a regará em outras fontes,
pois igual àquela prenda, jamais havia encontrado.
Lá de cima o Patrão Velho tudo vê e está sabendo.
O qüera de alma pura e nobre sentimento, sofrendo,
encambichado, quisera da prenda puro amor somente.
Que ranzinza, o patrão da casa grande... cuê-pucha!
De afogadilho fez mau juízo do peão erradamente,
de mal agido, igualando sua filha a uma pinguancha,
e desandou nele sua cólera com força, pesadamente,
enxotou-o sem tempo de trocar mesmo a bombacha.
Nem o brilho que reluz do peão a barba baça,
nem seu porte tão correto no exímio trabalhar,
nem seu topete altivo de não nunca refugar repuxo,
nem sua estirpe de jamais uma mínima trapaça,
foi capaz de conseguir um pouquinho amenizar
a dureza do patrão, tão ferida à queima-bucha.
Somente fazia esbravejar, louco de encanzinado.
Cego, não via franqueza no peão encambichado.
Na garupa carregando imensa e pesada saudade
mal ou bem, deveras, se aquerenciando, até então,
aqui ou ali, sem pouso certo, mais o peso da idade,
a trotezito, da vida ao fim, via-se chegando o peão,
já morto, há tempos, quando perdera seu coração.
Porém, eis que inusitadamente o senhor destino
bateu-lhe de frente com a prenda de modo repentino,
desatando as amarras, liberando a eles a velha paixão!