Só Pela Guitarra
Uma boinita atirada prá lado
Bombacha, botas e esporas.
Foi se chegando pela estância
Um jovem domeiro.
Vinha de manso com um porto
Acuerado no outro.
Muntado numa potra petra
Das fina raça campeira.
Se via pelos garrões que estavam
Lisos que era flete de lei
Nas lidas e percantas.
Pediu pouso por aquela noite
Charlou que vinha trazendo
Uma tropa prá bandas da
Vacaria.
Mas que sua querência
Era e bela princesa da serra.
Disse, que só pousaria e antes do
Cantar dos galos já sairia prá chegar
Antes da noite.
Mandei que largasse os pingos
No potreiro, e que o galpão
Podia pousar.
Me agradeceu com jeito.
E se foi prá seu canto.
Me pediu só umse podia
Pegar uma água e esquentar
Prá um mate novo.
Charlei que sim.
Que ficasse a vontade.
Depois de matiar um tanto
Tirou uma guitarra.
E dei um toque, prá ver
Se ninguém reclamava.
Daí se pós a guitarrear
Em silêncio que só se ouvia
O barulho chorado da guitarra.
Começou a juntar gente da
Estância prá ver o andante que
Ponteava a guitarra.
Primeiro os guris, depois a tias
Da cozinha até o patrão veio ver,
Quem era, que tocava.
Num upa estava cheio de gente
Assistindo em silêncio o andante
Que ninguém sabia o nome.
Mas a gauica tinha uma assinatura
A mesma que das bostas.
Também tinha sua marca mesma
Que dos potros que vinha.
Até que parou, e tomou um gole
De canha de suas coisas.
Umas das morenas das
Cozinha perguntou:
-Prá quem tocas?
Ele respondeu sem floreio:
-Prá uma china!
Voltou a pontear o pinho
Que se envergava no braço
Mas pegava com jeito
Como se abra-se um morena
Que gosta-se.
Guitarreo mais um tanto.
Depois se acostou nos seus
Pelegos num canto do galpão.
Talvez fosse sonhar com alguma
Prendinha que gosta-se.
No outro dia bem cedo
Quando tava já indo o patrão
Parou rodeio.
E ofereceu serviço prá o andante.
Aceitou mas charlou que ia
Na princesa da serra ver
Os seus, e voltava.
Foi e uns dias depois voltou
Prá trabalhar.
Foi ficando pela estância
E nas noites guitarreava.
As vezes ia na princesa da serra
Ver os seus.
Mas sempre voltava.
Um dia fez uma milonga e
Soltou a voz.
A milonga charlava de uma
Morena que gostava, mas
Ela não gostava do campo.
E o tempo foi passando
E guitarra nunca calou nas
Noites fria ou quentes do verão.
Dormia no num canto do galpão que
Patrão madou fechar a pedido dele
Que charlava que não precisava
De muito prá viver.
Foi ficando o andante que ninguém
Sabia seu nome e sua procedência.
Só sabiam que as vezes ia ver os
Seus na princesa da serra.
Até que um dia um grito
De um nome estranho prá todos
Da estância calou o andante.
Era seu nome, vinha do grito
De um índio que tinha pilchas de
Patrão.
Era o pai da morena que gostava,
Dizendo que queria o couro dele
Prá um laço de doze braças.
Quando o índio apeo e puxou
Da ferramentas, o andante já tinha
Cortado.
Pois ninguém sabia que era ligeiro
No ferro branco das adagas.
Caiu o índio coloriando o chão
Da serra.
E o andante charlou olhando nos
Olhos deles:
-Nunca encostei um dedo na sua
filha!
Uns correram prá apartar
Mas o andante de nome bonito
Não cortou prá matar.
Prá ele sempre lembrar que acreditar
Em outros sem saber da lida bruta no
Ferro branco.
Madou que retirassem o índio
Da estância e larga-se na
Entrada da princesa da serra.
Foi quando me contou a sua
Historia, que já tava cansado de fugir
De um estória inventada por china
Rameira.
E nunca mais tocou no assunto
Que sempre vinha por sua
Guitarra o apreço que tinha pela
Morena que gostava.
E o índio que foi o único
Que sabia seu nome, ficou
Com o fio de sua agada
Marcado nos braços e nos peitos.
E guitarra do andante nunca
Calou-se.
Sempre num toque faceiro
Que depois vinha a mesma milonga
Que lembrava dos olhos da morena.
Que cruza o corredor de seus
Sonhos.
Reculutos na sua guitarra.