luxuria poética

AS MULHERES

(Por: Gabriele D’Annunzio)

Houve mulheres serenas,

de olhos claros, infinitas

no seu silêncio,

como largas planícies

onde um rio ondeia;

houve mulheres alumiadas

de ouro, émulas do Estio

e do incêndio,

semelhantes a searas

luxuriantes

que a foice não tocou

nem o fogo devora,

sequer o dos astros sob um céu

inclemente;

houve mulheres tão frágeis

que uma só palavra

as tornava escravas,

como no bojo de uma taça

emborcada

se aprisiona uma abelha;

outras houve, de mãos incolores,

que todo o excesso extinguiam

sem rumor;

outras, de mãos subtis

e ágeis, cujo lento

passatempo

era o de insinuar-se entre as veias,

dividindo-as em fios de meada

e tingindo-as de azul marinho;

outras, pálidas, cansadas,

devastadas pelos beijos,

mas reacendendo-se de amor

até à medula,

com o rosto em chamas

entre os cabelos oculto,

as narinas como

asas inquietas,

os lábios como

palavras de festa,

as pálpebras como

violetas.

E houve outras ainda.

E maravilhosamente

eu as conheci.

(Trad.: David Mourão-Ferreira)

(GRABRIELE D'ANNUNZIO [Itália, 1863/1938] - poeta decadente, artista, músico, esteta, mulherengo, doidivanas, aeronauta pioneiro, bruxo negro, gênio e mal educado.)

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É parte de um pequeno trecho biográfico que o filósofo, anarquista e poeta escreveu sobre D'annunzio. É bem mais curioso:

[TRECHO BIOGRÁFICO DO POETA GABRIELE D'ANUNZZIO]

POR: HAKIM BEY (historiador, escritor e poeta anarquista)

Gabriele D’Annunzio, poeta decadente, artista, músico, esteta, mulherengo, doidivanas, aeronauta pioneiro, bruxo negro, gênio e mal-educado, emergiu da Primeira Guerra Mundial como herói e com um pequeno exército à sua disposição e comando: os arditi. Ávido por aventura, ele decidiu capturar a cidade de Fiume, na Iugoslávia, e entregá-la para a Itália. Depois de uma cerimônia necromântica com sua amante num cemitério de Veneza, ele partiu para a conquista de Fiume, e foi bem-sucedido sem nenhum problema digno de ser mencionado. Porém a Itália recusou sua oferta generosa. O primeiro-ministro chamou-o de idiota.

Ofendido, D’Annunzio decidiu declarar independência e ver por quanto tempo conseguiria mantê-la. Ele e um de seus amigos anarquistas escreveram a Constituição, que instituía a “música como o principio central do Estado”. A Marinha (composta por desertores e sindicalistas anarquistas dos estaleiros de Milão) se autonomeou “Uscochi”, em homenagem aos antigos piratas que em tempos passados viviam nas ilhas da região e saqueavam os navios venezianos e otomanos. Os modernos “uscochi” foram bem-sucedidos em alguns de seus golpes malucos: vários polpudos navios mercantes italianos de repente deram à República um futuro: dinheiro em seus cofres! Artistas, boêmios, aventureiros, anarquistas, fugitivos e refugiados sem pátria, homossexuais, dândis militares (o uniforme era preto com a caveira e os ossos cruzados dos piratas - depois roubado pela SS) e excêntricos reformadores de toda espécie (incluindo budistas, teosofístas e seguidores do vedanta) começaram a aparecer em Fiume aos bandos. A festa não acabava nunca. Toda manhã, do seu balcão, D’Annunzio lia poesia e manifestos; toda noite havia um concerto, seguido por fogos de artifício. Nisso se resumia toda a atividade do governo.

Dezoito meses mais tarde, quando o vinho e o dinheiro haviam terminado e a frota italiana finalmente apareceu e arremessou alguns projéteis contra o Palácio Municipal, ninguém tinha energia para resistir.

In: TAZ - Zona Autônoma Temporária

Gabriele D'Anunnzio e Hakim Bey

Serpente Angel
Enviado por Serpente Angel em 30/09/2019
Reeditado em 30/09/2019
Código do texto: T6757300
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