Elegia de Cadmo

Sigam! Sigam todos!

Sigam esse doce melismar,

Sigam as seivas da floresta,

Os retorques do vento,

E os encachos do mar.

Vistam-se! Vistam-se com nébrides!

Vistam-se com seus corpos,

Vistam-se como nunca se vestiu antes

Pois os tecidos da derme não mentem

Quando desejam-se pulsantes.

Comam! Regurgitem! Devorem!

Banquetes servem a servidão do servir,

Ceias aos seios, cálidas a mão,

Ervas e aromas do autepsioso fogo

Queimam e ardem vigorosa ilusão.

Gritem! Cuspam! Mordam!

Urrem até que se destrinche a glote,

Até que se seque a saliva,

Se rasgue as fibras,

E se enxarque os vasos de sangue.

Ouçam! Ouçam o canto!

Canto das longívas Mênides,

O canto que não se canta,

Ornando frigíade Cibéle,

Quem ouve foge em desvairo!

Reconheçam as feras!

Chupem todos os fluídos,

Não se prende aquilo que não segura,

Pois potência é movimento sem rédeas,

E Dionísio arauto da luxúria.

Lambuzem-se no mistério!

Derramem-se em si mesmos,

Numa incandescente mescla,

Entupam as retorcidas tripas,

Com vontade de loucura.

Possuam-se uns aos outros!

Nesse frenesi dos sátiros,

Que vomitam os beijos,

Defecam carícias,

E urinam prazer.

Fodam! Trepem! Gozem!

Orgias enfeitam o tesão,

Aonde chifres se quebram,

Serpentes se enredam,

E lobos se entreuivam.

Seres devassos!

Ergam os seus tirsos de videira!

Suas vidas não pertencem mais a razão.

Perecerão ao julgo de seus orgasmos,

Eternamente condenados a amar.

Amar!

Amar incessantemente!

Amar com toda sua intensidade!

Amar de forma horrorosa!

Amar o incomensurável amar!

Façamos brotar!

Desse solo fértil de pureza,

Vinho, leite e mel,

Que alimenta os cervos,

Enche as gazelas,

E nutre a natureza.

Criaturas perdidas!

Abaixem as armas,

Desmamem-se da lógica,

Marchem em direção ao magma,

E dissolvam suas vergonhas.

Devendo seguir a história,

Cortés consumido pelas Califernes,

Centuriões enfeitiçados por Maeve

Que envoltos por densa aphrodísia,

Dançam a híbris de sua castidade.

Nesse amaldiçoado ocidente,

Que finge seus esquecimentos,

Dissimulando a própria cura,

Se dorme um silencioso tormento,

Disfarce de sua insana postura.

Abandonem esses navios cruzados!

Atirem-se ao citéronio Oceano,

Lavem seus corpos dessa alma,

Mergulhem nas profundezas do sexo,

Ou afoguem-se em aisxinas tempestades.

O canto foi cantado,

Sonhos foram selados,

Impermeáveis consciências,

Frígidas potências,

Avessa a própria nudez.

Resta apenas um fio,

Uma última nota,

Ressoante distante,

Desse mundo sem mundo,

Antiga e oculta porta.

Que colhe invisível obscuro,

De um tempo sem tempo

Embriaguez das contradições,

Pesando-se em divinas medidas,

De perpétuas deidades multifloridas.

Ó Musas, que agora me esvaziam,

Lembrem antes de ir sua mensagem,

Não nos deixem sem tuas soníades,

Apenas vocifere aos poetas,

Que o estranho não se revela!