SEM RIMA 298.- ... barcos e vidas ...
Os poetas, as poetas, e não só,
abrigam-se sob símbolos para tornarem
líricos os seus textos sobre a Vida,
sobre o Amor, sobre a Morte, que são
os três assuntos cruciais por elas e eles
tratados.
Assim, a Vida pode ser "rio"
ou "caminho", ou percurso da "alva"
até ao "sol-pôr".
Também pode ser "barco"
ou "kybernetes", governante
que o conduz. Então a Vida
anda também ligada à "viagem".
Navego, como barco com rumo fixado, pelos mares
enredados da "internete" à procura de textos e comentários
sobre "barco", símbolo da Vida. E dei com o soneto do Pessoa:
A minha vida é um barco abandonado
Infiel, no ermo porto, ao seu destino.
Por que não ergue ferro e segue o atino
De navegar, casado com o seu fado? (etc.)
Nem o transcrevo completo nem vou comentá-lo. Há quem
o comenta.
Eu apenas me pergunto (não posso conversar
com o poeta por motivos evidentes...) se Pessoa não foi
pessimista com excesso... "Barco abandonado...no porto".
Pôde simbolizar a vida, sua, por um barco navegante
de mares, de oceanos ou mesmo de rios...
Ou talvez
pudesse servir-se do barco rabelo, a transportar vinho,
também símbolo (e fonte) de Vida, para, amoroso,
lhes dar às pessoas ocasião de fruírem êxtases
reservados aos adoradores do espampanante
deus Baco, coroados por pâmpanos ternos,
símbolo do futuro feliz que os poetas
costumam, em regra, augurar
a nós, infelizes mortais.
Mas não: o poeta acrescentou, simbolicamente,
a infelicidade do viver humano: "barco", "abandonado"
e, para além, "infiel".
Apenas faltou lhe dizer
"filho do pecado", do próprio e do original,
derivado do construtor.
Felizmente
há "barcos" diversos do pessoano.