Antonio Conselheiro
Não era baiano de fato, mas sim
Cearense nato. Seu nome?
Antonio Vicente Mendes Maciel
Nascido em Quixeramobim
Seu árido torrão natal!
O perturbado pai, segundo conta a história, tinha um sonho
Que tentou fazer virar realidade
Ver o seu primogênito, Vicente
Um dia ordenado padre e, para tanto
Não poupou nenhum esforço, embora fosse pobre
Para educar o menino na escola do professor
Manoel Antonio Ferreira Nobre!
A escola ensinava a língua materna, o português
Assim como o latim e também o idioma francês
Casou-se com Brasilina Laurentina, sua parenta
E com ela morou oito meses em boa convivência
Levando vida sedentária sem muita exigência
Mas a ruína financeira bateu à sua porta, com certa violência
Fazendo-o viajar pelo Ceará, em grande tormenta
Na tentativa de recuperar a estabilidade perdida
Buscou uma vida decente, uma vida condigna
Foi professor primário na fazenda de nome Tigre
Caixeiro em Campo Grande
Onde nasceu o seu primeiro filho e, acredite
Não imaginava o sofrimento mais adiante
A alegria durou pouco, logo se viu desamparado...
Pois o lugar em que trabalhava, que tristeza, foi fechado
E Vicente, coitado, ficou desempregado!
Resolveu, então, de profissão mudar, foi ser rábula
Defender os cidadãos daquele simples lugar
Que sem eira nem beira não tinham
Dinheiro para advogado pagar
A família de novo aumentada com mais um filho pra criar
O dinheiro muito pouco, a miséria a rondar...
Mudou-se então para Itu onde viveu no calvário
Passou necessidades e teve, por fim, o casamento findado.
Voltou para Tamboril e foi ser novamente
Professor primário na fazenda santo Amaro
Mas não era sua sina a de ser professor, de fato não era...
Inquieto, mudou-se novamente
Foi morar em Santa Quitéria
E lá se enamorou de Joana imaginária
Mística senhora escultora de imagens
Que com ele teve um filho
O terceiro na linhagem, de nome Aprígio
Irrequieto como era, decidiu voltar a Campo Grande e por fim
Para o trabalho de solicitador, mas fica pouco tempo e some
Enfim, ruma para o Crato e volta para Quixeramobim
contam por aí que o seu velho pai tinha distúrbio mental
E ele também demonstrou descontrole emocional
Ferindo o seu cunhado Lourenço a faca
Num embate descomunal
Foi perdoado pela irmã e pelo cunhado
Assim, poucos ficaram sabendo desse triste ato
Safando-se o Vicente de maldosos comentários
Tornou-se vendedor ambulante de muitas quinquilharias
Aguardente e miudeza para toda gente vendia
Nos arredores do Crato e nos povoados
Levava uma triste vidinha
Resolveu então voltar para vaqueirice
Herança familiar, mas contraiu uma dívida
Que não conseguiu pagar e revoltado
Resolveu novamente mudar
Intimado pela justiça perde seus parcos pertences
Virou então Antonio Conselheiro, o beato do nordeste
Mudou o rumo da história, virou mito, santo e penitente
Em meio a muitos beatos que infestavam o Ceará
Percorreu os caminhos do Cariri até as pancadas do mar
Na Bahia encontrou refugio, na cidade de Itapicuru
Restaurou igrejas, cemitérios e pra muita gente pregou
É cantado em verso e prosa, faz parte da nossa história
Mas, ainda hoje, ninguém respondeu à questão: seria ele
Um sábio, doente mental, alienado sagrado ou
Simplesmente um egocêntrico cidadão?
Que os entendidos respondam tamanha inquietação
Foi acusado de matricídio e recambiado para Fortaleza
Depois para Quixeramobim, onde foi libertado na certeza
De que nenhum crime a justiça lhe imputara, pois
Assim o juiz de lá pensava...Então...
Conselheiro teve a sorte de escapar da vida carcerária
Teimoso como ele só, voltou para Itapicuru
Foi novamente acusado, quiseram aliená-lo ligeiro
Levá-lo para um hospício no estado do Rio de Janeiro
Era de fato um valente, já não tinha medo de nada,
Mas escapou de ir para o hospício pelo fato de não haver vaga!
Achava que a República era composta por um complô
De maçons, protestantes, judeus e bandoleiros
Hereges que desejavam apossar-se do governo brasileiro
A desobediência civil custou-lhe muito caro
Foi perseguido pelo clero e também por militares
Mas continuou firme, enfrentando os adversários
Os conselheiros iam com ele para o céu ou para o calvário
Sua morada definitiva ficou sendo a fazenda Canudos
Seu lar, seu celeiro e seu importante refúgio
Era o líder das empobrecidas massas
O valente Conselheiro! Homem de muitas graças
Para os seus, um poderoso deus de muitas alegrias
Para as autoridades, um blasfemo, adepto da anarquia
Canudos, cheia de gente de vida independente
Onde o peregrino também era rei de energia efervescente
E a monarquia, Conselheiro defendia fortemente!
Centro de vida urbana; comércio, rezas e ladainhas
Mas a promessa de salvação eterna
Era realmente o que mais atraia
O rio de leite com barrancas de cuscuz
Seria o maná, pelas penitências de todos os dias!
Considerava-se uma autoridade e até mudou um nome
Fazendo Canudos, virar Belo Monte
Mas o sonho de liberdade acabou e foi muito triste
Para toda aquela gente que acreditou ser possível
Viver num mundo à parte, em pleno sertão do Brasil,
Desafiando as leis, com tamanha altivez
Em desobediência civil
Antonio Conselheiro, por certo conseguiu o que quis
Balançar as estruturas de todo o nosso país
Propagou a sua fé a todos os peregrinos
Povo humilde e crédulo que precisava de um santo, forte e bem vivo
Para minimizar com promessas de fartura e vida eterna
A miséria no sertão nordestino!