T I O - S I M P L Í C I O - Ialmar - Pio Tressino Schneider - - Tio Domingos e Anastácio e mais o seu Esmilindro formam o trio hoje findo que lutou no mesmo ofício; e com muito sacrifício, criando filhos dos outros,
T I O S I M P L Í C I O
Ialmar Pio Tressino Schneider
Tio Domingos e Anastácio
e mais o seu Esmilindro
formam o trio hoje findo
que lutou no mesmo ofício;
e com muito sacrifício,
criando filhos dos outros,
mas na domação de potros
parceiros de Tio Simplício!
Gaudério desde guri
e nas lides de campanha
era guapo; bebia canha
mas nunca foi caborteiro,
não ligava pra dinheiro,
tapejara de coragem,
pouca instrução e selvagem
viajava o Rio Grande inteiro.
Índio dotado de astúcia,
ajuizado e resoluto,
galopando em campo bruto
laçava com precisão.
Era visto no rincão
repontando gado xucro
e com isso muito lucro
proporcionava ao patrão.
Valente sem ser maleva,
até meio desconfiado,
sempre bem intencionado
lutava sem atrapalho,
disposto para o trabalho,
ninguém o engambelava,
grande jogador de tava
e carteador de baralho.
E nas horas de lazer
dedilhava uma cordeona,
pois na polca em redoblona
sempre topava a parada,
cantando a sua toada
com grande sentimento,
muito firme no instrumento
alegrava a gauchada.
Nas festanças e fandangos
era bem-vindo no mas,
pala atirado pra trás
pilchado com muito apuro
bombacha de pano escuro
botas à fole de gaita,
enfim um perfeito taita,
imponente pêlo-duro!
Foi também ao Paraguai
pelear por nossos direitos
e após de briosos feitos
naquelas plagas distantes
onde combates gigantes
lhe deram muita experiência,
retornara pra querência
destes prados verdejantes.
Então já tanto alquebrado
pelos reveses da vida,
a mocidade perdida
em tropeadas e guerrilhas,
pealado por armadilhas
que o destino lhe fizera
vê fugir a primavera,
anda em roupas maltrapilhas.
E assim velho e esquecido
vai chegando a decadência
de tão penosa existência
que tanto fez pelo pago;
por isso vive no trago
desde a manhã quando acorda,
pois é só o que lhe recorda
os tempos de índio vago...
Já no final da carreira
sem que ninguém lhe compreenda
vai de fazenda em fazenda,
procurando um pobre teto,
órfão de amigos e afeto,
não desejava mais nada
a não ser uma pousada
num abrigo humilde e quieto.
E dessa forma se apaga
vivendo de caridade,
ele que foi na verdade
mulato de muito brio
que tanto amou e serviu
este Rio Grande de antanho
defendido a ferro e estanho
quando o estrangeiro o invadiu.
Mas numa noite de chuva,
invernosa e sem luar,
Tio Simplício vê chegar
seu instante derradeiro
e encharcado no aguaceiro,
recostado num galpão,
morre sem a extrema-unção
esse valente tropeiro!
E patrícios lhes afirmo,
dizem que o berro do gado
retumba no descampado
reverenciando seu nome
e o tempo que nos consome,
jamais apaga a memória
dessa figura da história
morta ao relento e de fome!
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Canoas - RS, 18.08.1972
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Obs.: In Memoriam - ao amigo poeta e trovador
VALMOR ROQUE MANFROI,
por ter visto nascer, incentivar e divulgar a presente poesia, hoje residindo na Estância Eterna.