Feinho bom
Inspirado em Amor Feinho, de Adélia Prado
Um amor feinho ganha luz,
se faz bonito
quando por fim encontra
a senhora e dona de seu destino
Abandona a si
Um amor apagadinho
assume com todo gosto
sua nova identidade
Vem a ser
Zé de Zenaide
Tião de Nica
Manuel de Adelaide
Ama ser assim chamado
e vê no nome adotado
a natural unidade
de corpo e de coração
nascida de duas vontades
Um amor modesto
anda olhando pro chão
para manter, na ausência,
o mesmo respeito
que na presença se tem
Sozinho somente sai
em caso de precisão.
Se pudesse escolher
só andava emparelhado
Amor feinho por fora
por dentro, homem viril
que se mil vidas tivesse
por certo todas seriam
vividas de novo com ela
AMOR FEINHO
(Adélia Prado)
Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial;
o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero um amor feinho.
(Do livro Bagagem. Rio de Janeiro: Record, 2011. p. 97)