No Meu Tempo
Por Carlos Sena


No meu tempo não tinha televisão,
Tinha radinho AM
gente na porta conversando e
menino na rua brincando de garrafão.

No meu tempo quando muito moça usava bundex
Namorava no portão de casa
Não tinha silicone nos peito, nem botox
Vestia roupa discreta pra ver “roba cofe” no saudoso cine Rex.


Cabra cega, barra bandeira, esconde-esconde, queimado.
Casamento francês também se brincava, pois

brincar era nossa lei e nada nos metia medo.
Não se falava coisa feia, no máximo se dava o dedo.

Conversar miolo de pote, conversar mole, tirar um deforete...
Bagunçar na hora da aula não nos era assustador
Peraltice era bóia - bater na porta do zoto e correr
serrar velho na quaresma, gargalhar do dissabor.

Levar banana no lanche, beber no grupo leite de jia
Saltar corda no recreio, ah como eu fazia.
Professora ensinava, aluno estudava de cor e salteado
Tinha palmatória, tinha respeito, todo aluno aprendia.

Passear na praça, rodar nela e chamar as minina de pão...
Dedicar musica no alto falante – pense numa diversão
Imenso era o poder do pade, da autoridade de Valdemar.
A gente cheirava cangote das moça. Drogas? Pra que cheirar?

Jogar bola no campo, dançar no baile e no assustado...
Subir e descer ladeiras – Sábado dia feira!
Intensa era a serenata, baile no clube dos trinta era o apogeu
Pegar na mão das minina só quando a luz apagava em pleno breu.

No meu tempo não tinha café a vácuo nem filtro tipo Melita.
Pipoca era de milho espinho estourado no fogo de lenha
Resenha era coador de pano e café torrado no caco com rapadura
Gripe se chamava difuço, chá de sabugueiro nossa cura.

No meu tempo homem paquerador era inxirido...
Moça oferecida era alça de caixão 
Fugir com namorada era sinal de homem
Moça embuchada sem marido não tinha dos pais a benção.

 
No meu tempo tinha esbórnia que se chamava barrufo.
Tinha quenga nova, quenga velha e quenga dona de ricurso.
Uma famosa era Luzitana, caçolinha e Pixuta
Pense numas bichas boas assumidas como puta...
 
No barrufo do meu tempo, certo dia surgiu tal luz negra.
As putas se enfeitavam como quem vai a quermesse
Os homens subiram todos
Faltou puta pra quem quisesse.
 
No meu tempo copiar prova ela filar,
Professora tinha nome de gente – Rosália, Laura, Darcy.
Tabuada era obrigação, ler errado dava safanão
Canto orfeônico tinha -  dó, ré, mi, fá, sol, lá, si.
 
No meu tempo cinemascope era top.
Jovem dançava bolero, marchinha e ate tango
Mas, se de cabelo grande e calça boca sino
a língua ferina do povo chamava o caba de frango.  
 
Como se vê o tempo tem e o temputinha.
Se o tempo tem hoje crack também a cocaína
No meu tempo o crack era de bola
E se cheirava muito era o xibiu das minina...
 
Professor no meu tempo tinha nome e moral
Nossos pais num olhar nos desmontavam
Puxão de orelha resolvia nossa malcriação
Mas se não resolvesse, haja surra e bendito safanão.
 
Assim, seja feliz agora que amanhã o tempo será passado.
Seja feliz por nada e não ligue do povo o bedelho
Mas, se de todo você não for feliz
Que pena, deveria ter nascido em Bom Conselho.
 
 
Carlos Sena – Bom Conselho 23 de setembro de 2014