Murmúrio de América
Eu ouvi o grito pasmo
anunciando: terra à vista!
E o surpreso olhar
de Colombo e Cabral.
Eu li quando foi lavrada
minha certidão de nascimento
na carta ao rei escrita
pelo escrivão a bordo.
Eu vi meu ouro,
minha prata,
meu fruto
e minha seiva
roubados...
levados para além mar.
Eu vi meus filhos
receberem outros filhos
doutros cantos
doutras cores
que vieram para ficar.
Eu fui menina
fui donzela...
fui branca, fui parda
fui negra
fui mãe, ou talvez mulher!
Eu acolhi e abracei
alimentei em meu seio
o nauta, o imigrante
e o suor de seu rosto
eu o transformei...
em pão!
Eu senti filho
o peso de cada elo
o horror sem paralelo
da cruel escravidão.
Ouvi corrente rangendo
liberdade a corroendo
vi o ferro se partir
vi alforria surgir.
Eu vi a flor calcinada
em meu ventre
nos arames de Guantánamo
e nas vidas dos meninos
que a guerra me roubou.
Eu sou "América”
eu tomei chá com a lua
abri para lá uma rua
quarenta e tantos anos atrás.
Meu sangue quente latino
e as rédeas de meu destino,
minha alma de menino
não se pode controlar.
Sou eu colcha de retalhos
alinhavada multicor
canto de esperança
flor que desabrochou.
*obra a quatro maos,com minha amada esposa e poetisa jujumary.