Bicho Cabra.
O bicho cabra tem nome.
É forte que quem tem no coração o sentido o tino faz doer,
faz chover no sertão, queimando de sal as lágrimas do chão.
É brasa, é brisa, é prumo perdido,
perdido o sereno no sumo do tempo,
batido no vasto ventre da barriga de todas as mães.
É cobra, veneno de terra correndo vento,
abrindo o bucho da vida a foice sem castigo.
O bicho cabra tem nome,
tem fama de maldição,
tem pressa, tem fumo e reza de parteira benzedeira,
tem morte a espreita de um corte que lhe apeteça,
corte que abra em rios os rachados da mão,
os calos da mão, os calados da mão.
Tem nome de demo, de dente afiado, de peste na brasa da escuridão,
na vasta lombriga de menino que é anjo antes de homem,
que é bruxo antes de santo,
que é visagem, bestagem, tudo mais.
Tem nome nos obscuros, na prosa escondida, na seca da língua,
sem fé, faminto destino tem nó na vingança,
tem estrada fechada de abismos,
tem troça de gente que ri da desdentada sanha de seu povo,
tem troço esquisito, tem um tambor que toca o silêncio,
no vasto e infinito da queda de um só: o peito batendo.
Espreguiça, envergonha, entristece
e se mete a fazer paisagem de sonho,
na rede, na trama, no barco, no berço da minha cidade,
o cabra tem nome de gente sofrida e guerreira,
o cabra é o verbo:
Nascer, Viver, Viver de tanto nascer.
e o verbo é sempre o seu mesmo desterro,
seu nome de cuia, seu fim sem bagagem: sofrer.
Patrícia Porto