MIGRANTE
vim lá do sertão do meu nordeste
fugindo daquela peste
de miséria que há por lá!
viajei de jegue nas chapada,
de carona nas estrada,
inté belém do pará.
dispois de arguns dia, embarquei no são joão,
tive medo, mas jurei que não.
como é que podia eu, sujeito-decisão,
me acovardá naquela situação?
dispois de uma noite e um dia
cheguei aonde passaria
a tê trabaio e gãio tê.
era uma agradáve cidadela,
portel era o nome dela,
terra boa de vivê!
só que arguns dia dispois da minha instalação,
deu-se na cidade uma invasão.
tantos forastero, numa grande murtidão,
trazendo violência e confusão.
ero os caçadores de gato
que ali chegaro pelo mato.
caçavo, destruío – sujeitos-devastação –
matavo sem respeito e sem perdão.
foi aí que deu-se um fato triste
e, se é que a sorte inxiste,
ela num me ajudô.
um gatero matô um sordado,
fugindo, após tê matado,
e um otro me acusô.
nem sequé dero direito de me defendê:
“te cala se não tu vai morrê!”,
dissero os sordado que viero me prendê.
por isso, eu nada pude fazê!
fui preso e logo fui jurgado
e, o que é pió: fui condenado!
e tô cumprindo pena aqui num tar de são josé,
que tem nome, mas santo em nada é!
vejo como a vida é coisa séria,
vim fugindo da miséria
e na maió miséria estô.
ah! se eu pudesse, eu vortaria
pros braço de mia maria
que no nordeste ficô.