O IMPÉRIO DA CAATINGA
(Apresentado numa cantoria no dia 13.07.2002 no Ginásio de Esportes
de PIO X-PB)
O cangaço apareceu
No nordeste rasileiro
Na região semi-árida
Abrangendo por inteiro
Sete entre os oito Estados
Só o Maranhão foi poupado
Desses tipos desordeiros
Onde o palco dos eventos
Eram os confinamentos
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Se Pernambuco era o centro
De coronéis e coiteiros
Era também o Estado
Que tinha mais bandoleiros
Talvez pela circuntância
Pela água em abundância
Talvez por ter mais dinheiro
Mais força policial
Mais sangue no matagal
NO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Mas o cangaço existia
Nas caatingas Sergipanas
No Rio Grande e Bahia
Nas terras alagoanas
Paraíba, Ceará
Quem habitava por lá
Se envolvia por inteiro
Com alguns na decorragem
E outros tirando vantagem
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Os sertanejos sedentos
Muitas cacimbas cavavam
No leito seco dos rios
Que mais e mais se afundavam
Nesse cenário infeliz
Não ficou uma raiz
Debaixo dos umbuzeiros
Que matava a sede louca
Ou umedecia a boca
NO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Marmeleiro, catingueira
Jurema-preta, pinhão
Angico-preto, aroeira
Era ramagem padrão.
Pelo solo quebra-faca
Velame branco, alfavaca
Unha-de-gato, espinheiro
Só por isso a precisão
De perneira e gibão
NO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Hoje de qualquer maneira
Embora modificado
O Império da caatinga
Ainda exerce seu reinado
Milhares de emigrantes
Flagelados retirantes
Se ver no Nordeste inteiro
É o cangaço desarmado
Diferente do passado
NO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Sai o povo, morre o gado
Em todo esse sertão
Não há um só camponês
Que mostra satisfação
Acabam-se os animais
Ficando limpo os currais
Não tem galo nos terreiros;
Também não existem mais
Os alpendres colossais
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
As rolinhas pelo chão
Que arrulhavam saudosas
Gemem hoje, coitadinhas,
Mau satisfeitas, queixosas,
Aqueles lindos tetéus
Com penas da cor dos céus,
Onde algum faz seu viveiro
Está mudo, triste e sombrio,
Não passeiam mais nos rios
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
O cangaço do passado
Tinha o espectro da morte,
Hoje o cangaço é estrada
Sem direção e sem Norte;
Procura a vida e não ver
Apenas ouve gemer
Cigarras nos tabuleiros
Somente campo desnudo.
Bem diferente de tudo
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Foi a fome negra e crua
Nódoa preta da história
Que trouxe o ultimatum
De uma vida provisória
O livro da existência
Com energia e ciência
Fez o decreto primeiro;
Depois formou outra etapa
E mandou riscar do mapa
O TEMPO DOS CANGACEIROS.
Os coronéis decretaram
A sentença foi cumprida
Descarregando seu gládio
Tirou-lhe de um golpe a vida;
Não olhou o seu Estado
Deixando desamparado
Pobres no sertão inteiro:
Que ilegalmente ou não,
Recebiam a proteção
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Aqueles campos que eram
Por flores alcatifados
Hoje parecem sepulcros
Pelos dias de finados;
Os vales daqueles rios
Aqueles vastos sombrios
De frondosos umbuzeiros
Conserva a recordação
Da sombra esfriando o chão
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
O gado urra com fome
Berra o bezerro enjeitado
Tomba o carneiro por terra
Pela fome fulminado
O bode procura em vão
Só acha pedras no chão
Começa logo o berreiro
Cabra e filhotes aflitos
Diferente dos cabritos
DO TEMPO DOS CANGACEIROS.
Grandes cavalos de sela
De muito grande valor
Quando passam na fazenda
Provocam pena ao senhor;
Como é diferente agora
Aquele animal de outrora
Robusto, forte e ligeiro
Era russo hoje está preto
Parecendo um esqueleto
DO TEMPO DOS CANGACEIROS
Mas tudo isso é debalde
O inverno é soberano
O tempo passa sorrindo
Por sobre o cadáver humano
Nem uma núvem aparece
Alteia o dia, o sol cresce
Deixando a terra um braseiro
E tudo a fome morrendo
Como os homens perecendo
NO TEMPO DOS CANGACEIROS.