Herdeiros de Pilatos

A mesma água cujas mãos foram lavadas

Os mesmos olhos que viram a cruz,

Que viram os braços abertos no Gólgota

Os braços que se cruzaram coniventes.

Reincarnaram e pilotam mãos sedentas por pólvora

Fingindo agradecer, fingindo rezar

Forjam o Añjali Mudra,

Arrotando moralismo e santidade

São os Ahasverus pós-modernos

Que em nome do Cristo cospem no próprio.

Ególatras travestidos de cidadãos de bem

Herdeiros perversos de Pilatos,

Mas ao invés de lavar as mãos, pedem fuzil

Se o coração está vazio pouco importa a barriga

O paradoxo temporal da subjetividade

Onde os algozes militam a favor daquilo que se dizem contra.

A mão que pede comida

É a mesma que puxa o gatilho

A boca que pede liberdade

É a mesma que escraviza de cima púlpito.

A bíblia que outrora era amor

É de ferro e cospe chumbo

Versículos que convertiam e salvavam

São balas de grosso calibre

Quem tem olhos, veja

Quem tem ouvidos, ouça!