Demôniocracia
Não imaginas o alvoroço que foi
O julgamento do Diabo.
Metade daquele povo esperava de pé,
A outra metade, feliz de novo, sentado.
A intimação chamava a nação a depor,
Mas não como testemunha.
Como réu, dizia o consciente papel.
Assinado: Milhões de Cunhas.
Assustada, porém ‘crente que é’ inocente,
Não aceitava o que aquilo propunha.
E com um candidato, claramente culpado, em mente,
Foi depor o Brasil, roendo as unhas.
No tribunal ideal era só gritaria
A defesa gesticulava, ‘arma’da de si:
- Ele mentiu! Nos enganou!
- Não temos autoria!
A juíza calada, ouvia,
Mas como não era morna,
Em uma tentativa de fazer poesia, respondia:
- 'Bah', 'Piá', isso ‘não orna’.
Não sabia aquele povo tolo
Que a excelentíssima espada,
Era íntima de Hannah Arendt,
E não engolia conversa fiada.
O tinhoso chegou. Finalmente!
Com o mesmo sorriso safado.
Dezessete advogados tinha o infeliz,
Direitamente patrocinados.
E para a surpresa de toda a assembleia,
Se declarou inocente:
- Nunca menti! Nunca enganei!
- No máximo ‘paguei’ de crente!
O júri se reuniu, e sem ao menos debater atingiu o veredicto.
Lendo-o estava a jurada História, com um triste tom de ‘já vi isso antes’:
- O voto é sim! Pelo povo ao autoritarismo adicto!
Caminhando e cantando, chorou então, o desperto gigante.
Foi aí que vi que seriedade não é cara fechada,
Pois, a juíza apontando a miséria, e
Com um trágico sorriso na cara, falava:
- Podem ‘já ir’ se acostumando, cambada.
Terminado as cerimônias, fui ler a ata,
Que pensava estupidamente inadequada
Já que naquela terra platônica,
Ninguém nunca esquecia nada.
Para minha surpresa, entendi nesse instante a função da arte,
Pois, em um santinho verde e amarelo,
Já com a escrita meio borrada em parte,
Lia-se irônico verso sincero:
“Coitado do povo plebeu!
Tentando votar em Messias,
Mataram de novo O judeu”