Declaração à Pátria e aos Seus.

Amor a cada quadriculado do caleidoscópio

De humanos

A cada campo de futebol de areia

Cada casa sem acabamento

Cada caudilho

Cada tocador de boiada

Cada morador da aldeia

Cada antigo quilombo

Cada pescador

Cada herói redentor

Cada rompante de liberdade

Amor a cada obra de arte

Amor às batatas do vencedor.

À Carta que primeiro te citou.

Ao dilema de um romance subjetivo.

A cada cordel com dialetos nordestinos

A cada acorde de uma música esquecida da MPB

À bossa nova

A cada fruto da terra

Terra cheia de laranjas e palmeiras e bananais

Onde a preguiça descansa nas árvores, e as capivaras na frente do Jardim

Botânico

Amor a cada gente

Como tantas bolinhas perdidas nos jogos

de taco

de cada rua onde alguém corre descalço

E a cada carro que passa por tantos olhares que se fecham ao cruzar a paulista

A cada caminhoneiro que desbrava a grande rodovia

A cada dançarino de frevo

A cada admirador da música clássica

Funk ou rap

De tantas as cores que exalam

De tanto verde que escorre como o sangue

de todos os que tem esperança hemorragicamente.

Amor do Oiapoque ao Chuí

A cada nota do teu hino

A cada pular de fogueira

e bater do sino

Amor às festas de São João

Amor a Paulo e Catarina

Amor aos tantos sorrisos

Às tantas carnes

Aos queridos mortos que nos aquecem a alma

com a arte

Ao avião

À batalha e aos resistentes

Amor aos que não aparecem nos jornais

Aos que levam a vida, apenas

E são a própria encarnação do belo

ou trágico,

sem se dar conta disso

A cada tapioca, moqueca, acarajé

Ou feijoada

Minestra, Pão de queijo,

Ao chimarrão, cuia, bombacha e bomba,

Por tanta madrugada viva

Pelas cachoeiras

Lagoas e praias e floresta

E pelo bar da esquina e pela festa

E pela troca de experiências em cima da casa

Amor por churrasco e pelos veganos e pelos animais

Pelas araras, pelos tucanos

E pelo samba e vaneirão

E por tudo o que é agitação das moléculas dos teus filhos

Como o ritmo que se mescla e mascara

E mistura e move, não para

Pelo movimento, pelo batuque,

Pela guitarra e berimbau

Pelo pandeiro, pela sanfona,

Berrante, violino.

Pela arte e pelas crises de poesia

Amor por tantos olhares no coletivo

Pelo público.

Amor junto às preguiçosas manifestações de segunda

como um corpo sedento de pernas

Ao Urucum e às cores quentes do tropical

Por amor ao riso e à graça de tudo

Com todo o Pau Brasil

Amor ao Futebol, e à aguardente com limão

Ao pé na bola e

À sensação de vitória que nos lembra o primeiro mundo,

Apesar dos vários amantes da sujeição

A vida resiste

E nosso calor é teu

Por todas as estrelas do céu abençoado

Por tantos credos

e por tantos sonhos

e pelos criados pela vida

E apesar dos muros que nos aprisionam

e escondem o amor que existe ali buscando ser escrito

Mesmo com tanta espreita

e com tantos que preferem a parte de cima do mapa mundi.

Mesmo com nossos ismos incompletos e impotentes,

Mesmo com a famosa alternativa rápida, viável e imoral,

Cunhada de jeitinho próprio, sempre impróprio,

Mesmo com tanta indiferença

Com as tantas asas cortadas

E animais presos em jaulas

Apesar da areia seca no fundo do rio

Mesmo com tanta gente sumida

Com tanto cão vira lata

Apesar de cada dor que dilacera e não mata

Ainda há caridade.

Ainda há crença.

Ainda há verdade.

Ainda há música, drama. Ainda há vida.

Ainda reside o sentir e a memória latina.

Apesar de tanto ódio, ainda há pódio.

Ainda há amor, calor, e tu.

Apesar dos excludentes

há acolhida.

Apesar da passista violada

Apesar de nem toda notícia ser circulada,

há comoção.

Apesar do tanto que teu povo quer ser armado e amado,

frustrado.

Em SP

Em SC

Em MG

Em MT

Em Brasília

na verde e na amarela

Apesar de tudo,

de tanta guerra,

há amor nos contradizentes.

Ainda há resistência, luta e beleza.

Apesar de tanta mordaça de ouro

De tanto frio no calor de Natal

Ainda há gente.

Ainda há baile.

Ainda há carnaval.