Bem mais que dança, bailado;
que som, melodia;
que voz, sobrecanto;
que canto, acalanto;
que coro, aleluias;
que cânticos, paz.

 
Bem mais que rubor,  saliência;
que encantos,  nudez;
que imoral,  amoral;
que bosques,  fragrâncias;
que outono,  jasmins;
que ventos,  orvalho;
que castelo,  arredores;
que metáforas,  rios;
E um pouco além:  tsunamis.
 

Bem mais que naus,  sentimento;
que excelsa,  nascendo;
que olho,  contemplo;
que invade,  arrebata;
que vitrais,  catedral;
que versos,  vertigens;
que espanto,  tremor;
que êxtase,  pranto;
que apatia,  catarse.
 

Bem mais que contas,  rosário;
que prece,  amplidão;
que o menino,  sua mãe;
que Império,  regresso;
que palmas,  martírio;
que anúncio,  Jesus;
que Ceia,  Natal.
 

Bem mais que alegria,  ternura;
que espera,  esperança;
que enlevo,  paixão;
que adeus,  solidão;
que dor,  amargura;
que mágoas,  perdão;
que ausência,  oração;
que abandono,  renúncia;
que angústia,  saudade.
 

Bem mais que anciã,  joyceana;
que lógica,  onírica;
que o Caos,  Amadeus;
que ouro,  tesouro;
que ode,  elegia;
que amiga,  inimiga;
que insensível,  cruel;
que signos,  símbolos;
que análise,  síntese;
que partes,  conjunto.
E um pouco além:  generosa.
 

Bem mais que efêmera,  sândalo;
que afago,  empurrão;
que clássica,  cínica;
que exceto,  inclusive;
que inserta,  incerta;
que adubo,  arrozal;
que oferta,  procura;
que unânime,  única.
E um pouco além:  tempestade.
 

Bem mais que ouvida,  vivida;
que austera,  singela;
que pompa,  humildade;
que solta,  segredos;
que fim,  reinício;
que um dia,  mil anos.
 

Bem mais que reis, majestade;
que jus, reverência;
que casta, princesa;
que moça, menina;
que jóia, homenagem;
que glórias, grandeza;
que ocaso, esplendor;
que espadas, correntes;
que Meca, Lisboa.
E um pouco além: messiânica.


Bem mais que pingos,  Dilúvio;
que água,  Oceano;
que mares,  o Mar;
que porto,  Viagem;
que cais, caravelas;
que rochedos,  neblina;
que vôo,  Infinito;
que Abysmo,  gaivotas.
 

Bem mais que a tribo, navios;
que lanças, tristezas;
que campos, senzalas;
que bodas, queixumes;
que soul, sem palavras;
que o tronco, maldades;
que ais, maldições;
que feitor, descorrentes;
que mandinga, orixás;
que samba, kizomba;
que "meu rei", Ganga Zumba;
que olhos baixos, quilombos;
que discordo, proponho;
que cedo, concedo;
que escravos, Zumbi.
 

Bem mais que brisas,  Luanda;
que ondas,  Guiné;
que amarras,  Bissau;
que o azul,  São Tomé;
que náutica,  Príncipe;
que axé,  Moçambique;
que opressão,  Cabo-Verde;
que fragor,  linda ao longe;
que injusta,  perversa;
que abutres,  pombinhas;
que trevas,  pavor;
que rondas,  terrores;
que bombas,  crianças;
que tágides,  ébano;
que o Sol,  rumo ao Sol.
  

Bem mais que luar,  nua e crua;  
que longínqua,  inerente;
que ornamento,  plural;
que ira,  atitude;
que abstrata,  denúncia;
que conceitos,  Nações;
que Camões,  mamãe África.

 
Bem mais que ética,  ascética;
que pro forma,  erga omnes;
que emoções,  decisão;
que rodeios,  sentença;
que Direito,  Justiça;
que leis,  Lei Maior.

 
Bem mais que flor,  Amazonas;
que improviso,  jeitinho;
que frágil,  incômoda;
que alvor,  cisnes negros;
que escrita,  esculpida;
que lírios,  o campo;
que veredas,  suindara;
que denúncia,  ira e dor;
que bonita,  pungente;
que amena,  os sertões.
E um pouco além:  condoreira.


Bem mais que lares, veleiros;
que adeuses,  partida;
que  feitos,  missão;
que honras,  repouso;
que canto,  epopéia;
que mística,  fado;
que areias,  miragem;        
que sonhos,  delírio;
que vozes,  visões;
que acaso,  destino.
E um pouco além: portugais.
 

Bem mais que errante,  farol;
que  ânsia,  horizonte;
que distância,  presença;
que solo,  emoção;
que países,  Galáxia;
que intensa,  profunda;
que letras,  magia;
que formas,  sentido;
que textos,  teoremas;
que idéias,  princípios;
que imensa,  perfeita;
que graça,  milagre;
que arcanjos,  fulgor;
que dádiva,  Mãe.
 

Bem mais que luz,  primavera;                
que estresses,  estrelas;
que audácia,  tumulto;
que estética,  rústica;
que em paz,  desinquieta;
que estática,  cíclica;
que cercas,  muralha;
que assédio,  conquista;
que plantas,  concreto;
que escombros,  palácio;
que átomos,  Deus... 
  
Jô do Recanto das Letras
Enviado por Jô do Recanto das Letras em 21/08/2011
Reeditado em 21/08/2011
Código do texto: T3172659
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