Carta
Carta
Ó, Cefalópode do povo, alegria da nação
Ouça, ouça, corajoso, o calor desta oração
Tu, que das águas mais tórridas nasceste herói
Tu, que sabias e clamas ainda saber o que nos dói
Peço, não por meu povo, pois povoo outros cantos
Peço, não sem sorrisos, mas lhe peço aos prantos
Por favor, olhai tu, que agora de cima nos olha
O Sertão não lhe pede a chuva que à seca molha
O Amazonas não lhe pede proteção
Das frentes quentes que assolam seu verão
Nem pede o Tietê que o desvie assim
Da cidade que ainda o destrói sem trégua ou fim
Peço por mim, tão somente
Tento ser sincero, e não demente
Que, quando vôo ao meu Brasil
Volto tomando um grama de Anafranil
E, se decido por seu país ficar
Temo tanto, mas tanto não voltar
Que se criam em mim novas fobias
Acredite, Cefalópode, isto não motiva folias.
Ou, apenas caminhando pelas ruas
Tenho de suportar toda a meninada nua
Pedindo esmola e vendendo bala
Com seu olhar pobre minha agonia se embala
Ou, ainda, lhe peço humildemente,
Pois, Cefalópode, homem feito não mente
Que nossos oficiais oficializem
O uso do bom senso, e sua honestidade mobilizem
Ora, estamos todos no mesmo barco!
Os gringos daqui inda hão de partir teu arco
E os indios do Amazonas inda hão de nos reinar
São únicos, afinal, por nossa água a lutar
E a seca do Sertão espantará nosso nordeste
Que cultivará, então, nosso sudeste e centro-oeste
Cansados das safadezas solidárias nem no câncer
De um governo desgovernado, ao menos algo bom há de nascer
Peço, todavia, que vença com honra esta próxima batalha
Pise encima dos teus mais estúpidos inimigos, a gentalha
Mesmo sendo tua visão inda cega, eu lhe garanto
Dia mais, dia menos, todos cairão nesse mesmo canto
E teu emprego, malandro, há de se estilhaçar sem encanto
Abraço, Cefalópode, cuide bem de teu Brasil
RF
(Publicado n'Os Intensos, hoje, 23/08/2006, Todos os direitos reservados a Shaping Performances, Inc)