O Par
O par de sapatos fala por si só,
Tem vida própria,
Tem sentimentos,
Movimentos.
Um pé é astuto,
O outro marrento.
Vivem se pisando
Em seguida esquecendo.
Direito esquece o que passou
Esquerdo remoe com rancor,
A cor dos dois já desbotou,
Mas nada apaga
As pegadas que o par deixou.
Andaram juntos por anos a fio,
Correram rápido, em marcha servil,
Por onde passaram, ninguém viu.
Um dia as pegadas chegaram ao destino
Cansaram da saga, descansar queriam,
Mas o dono do par,
Era muito mesquinho,
Ao sapateiro os levou,
Com cola remendou.
A sola consertou,
E ao chão o par voltou.
Apesar de tudo,
O par sempre foi par,
Jamais Direito deixou Esquerdo,
Para sempre juntos os dois viveram,
Por maus bocados passaram,
Mas seus cadarços, juntos amarravam,
Pelos caminhos juntos andaram,
Abandonar-se... Jamais pensaram.