TORMENTA

Um manto escuro e pesado desce

Lentamente meus olhos observam

Na linha ao longe a imagem que cresce

Densa dança em gotas que pesam

Galhos acenam suas folhas

Um cumprimento ou adeus para quem vê

Redemoinhos domam as palmas soltas

Lamentos em letras úmidas demais para ler

Estrondos acendem o cinza estampado

Veias azuis transludem o olhar

Dos que sentem o sopro encorpado

Tornado em tormenta no céu a sangrar

Intensos açoites lançados ao chão

Tecidos mesclados pelo choro

A pele lavada ao toque do algodão

Fios embebidos colados no rosto

Comunhão e pressa em fuga, pés e poças

A mão aperta e refuga a rebeldia dos vestidos

A atenção acerta o viés e o decoro das moças

Lufadas fortes destorcem cada um dos abrigos

Minha visão nublada ainda insiste em encontrar

Um caminho seguro em meio ao turbilhão

Mas só há desalinho em meio à imensidão

Os céus desabam, impiedosa fúria em pesar

Lágrimas, rios e oceanos se mesclam em dor

Trágicas agonias em fios humanos de clamor

Por algo cada vez mais distante

Águas calmas, fora de alcance

Pedras que caem, lançadas ao ar, poder interno

Forçadas a ruir pela vontade das chamas

Setas selvagens em claros sintomas

Projetadas pelos céus, moldadas no inferno

Bocas famintas se abrem no asfalto

Engolem sem predileção o que é tragado pela garganta

Já não há distinção entre a terra e o alto

Tudo é água, tudo é dor, nem mesmo uma prece adianta

Aos poucos, o azul dissipa as trevas

Uma luz esguia alcança o horizonte

Ameniza as dores por demais longevas

Acalenta, por mais que a tormenta amedronte

Flávio de Souza
Enviado por Flávio de Souza em 15/10/2023
Código do texto: T7909444
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