Dormindo com os peixes
Fecharei meus olhos e dormirei
Para sempre, em sono profundo
Do qual jamais despertarei
Imersa nas águas do submundo
Entregarei minha alma ao oceano
E velarei meu corpo em sua profundidade
Não vacilarei outra vez em solo profano
Pois descansarei em liberdade
Da terra dos trovões calados,
Onde os sonhos já não importam mais
Junto ao tempo, meus sentimentos selados
Indiferentes aos reclames dos demais
Meu sangue mancha a água
E minha carcaça alimenta os animais
Bocas famintas devoram a mágoa
Presa em pulmões que não respiram mais
Não existe mais sol, estrelas nem céu
No jazigo das águas escuras
Tribunal, júri ou réu
No abismo das almas impuras
Não há saudade que retorne
A um coração já sem vida
Para atrapalhar quem dorme
E reabrir uma ferida
Não há remorso que atormente
Uma consciência esquecida
Nem há prece que acalente
Uma essência já perdida
Onde os mortos repousam
E os anjos não ousam
Fiz meu berço, meu lar
Um lugar para retornar
A luz se esgueira em feixes
Refletida sobre escamas
Onde não me tocam as chamas
Pois durmo junto aos peixes