RITMO NO JAZIGO
Passei a mão sobre minha pele naquela noite. Coisa alguma parecia tão fria quanto ela. Nada se assemelhava aquela tela áspera cheia de suor. Um suor hipotérmico, quase inato de mim mesmo. Pele nenhuma poderia ser como a minha. As batidas descompassadas do meu coração rangiam em todos os ouvidos atentos toda a minha oração de desespero.
Esses ‘beats’ rítmicos de uma canção trágica poderia encantar multidões, se elas pudessem ouvir. Mas não ouviam, não notavam o tambor em seu grave furioso. Na fúria do instrumento que jazia em mim, havia um sentimento de desistência. Todos fingiam serem persistentes, por isso não podiam perceber meu medo, em um tom de alarme matinal, daqueles que fazem o ouvido tinir.
Cavei os buracos e me pus dentro deles, semeando grãos já apodrecidos. As batidas mortais do meu último suspiro jamais serão ouvidas pelo público em marcha contínua, quando do solo nada brotar no crepúsculo da próxima manhã.