Impuro

Sou o precipício da razão

Não medido em lágrimas

Muito menos em emoção

Sendo eu o contrário da bela

Contento-me em ser fera

E que seus olhos jamais vejam

Jamais contemplem minha escuridão

Na imensidão dos meus abismos

Ou na minha força inigualável

Temida como um sismo...

Sim, me rastejo, procuro

Por um fiapo de memória

Nessa noite tão inglória

Resplandece sua beleza

De inimaginável grandeza

Ilumine se puder, se quiser

Aqueça meu coração pequeno

Que as vezes se agiganta

Desatando o nó preso na garganta

Gritando pragas pelo escuro

As vezes, sou assim, impuro

Se preferir me julgue

Subjugue meu reflexo

Ou desconjure meus demônios...

Mas não me atire mais ao chão

Mas sem perdão me condene

Me leve aos infernos mais temidos

E como fera que sou

Não fuja com o estrondo do meu rugido

Mas fique!

Fique mesmo que não possa encarar

Fique mesmo que minhas chagas

Ou velhas feridas sejam incuráveis

Nada me resta na memória

Mas meu coração está cheio

Não é apenas um resto

Ou um copo com bebida até o meio

Transbordo e me afogo

Me afogo no seu prazer

E me desfaleço em sua loucura...

Perdido na noite mais escura

Uma velha fera ainda te procura

E talvez eu te encontre

Te afaste ou te ilumine

Te ilumine com minha luz pálida

Cálida e carente de razão

O coração bifurca

Mas intensamente pulsa

De um átrio a outro

Me levando a você...

Sim, sou fera

E nessa noite é a morte que me espera

E dela não espero perdão

Já que meu pobre e louco coração

É talvez maior que o mundo

Apesar de as vezes pequeno e imundo

É tão humano quanto o seu...

Paulo Raven
Enviado por Paulo Raven em 27/01/2020
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