A herança de Jápeto
Pouco a pouco, gole a gole
Como uma doença sorrateira
O tempo a tudo corrói
Até os sonhos de uma vida inteira
O cigarro aceso entre os dedos
Amarelos como os olhos ébrios
Intangível felicidade almejada
Que se esvai na síntese do credo
Dogma traduzido como angústia
Dos enganosos preceitos da fé
Agonizam na treva perfeita
Do morto que acha que ainda não é
Desse suspiro de dor agonizante
Mais um traído ainda se culpa
Mesmo vítima do escárnio divino
A morte que espreita delirante
Ludibriando a construção de sua tulpa
Encarcera-te num mórbido destino
A salvação, essa mentira tola
Que aprisiona corpos e espíritos
Faz suas vítimas submissas
Delirantes, pobres contritos
“Começas a morrer quando és fecundado, e nesse intervalo que chamam de vida, apenas cumprirás a vontade promíscua do destino”