Alceste, o ocultista de Vilnius (Canto VII – Conclusão)
"E, por ora, os calafrios e geadas do inverno chegavam ao fim,
E a encantadora primavera fazia maravilhas por toda parte."
(Kristijonas Donelaitis, AS ESTAÇÕES)
I
A primavera havia chegado,
E a desolada paisagem invernal
Tinha por completo modificado:
As brancas neves e o vento glacial
Deram lugar a uma brisa refrescante
E à grama, que viçosa e verdejante,
Já ia recuperando o seu lugar.
Flores de arruda começavam a enfeitar
As árvores, erguendo-se frondosas,
E as aves, sentindo agora o calor
E da brisa nas asas e faces o frescor,
Cantavam singelas canções maravilhosas
Em tributo à beleza e à renovação
Que a terra trazia aquela estação.
II
Não só o clima havia mudado:
É também importante ressaltar
Que Alceste e Dalia haviam se casado.
Sem mais nenhum vilão para os perturbar,
Agora podiam viver alegremente,
Amando-se pura e sinceramente.
Dalia era uma noiva deslumbrante;
Alceste também estava bem elegante,
E a cerimônia fora maravilhosa –
Todos os que dela participaram
Por semanas entre si comentaram
Que Dalia era a mais venturosa
Das noivas, e que a ela ninguém se igualaria,
Pois era a personificação da alegria.
III
Os nubentes também haviam percebido
Que um singularíssimo convidado
Na cerimônia havia se imiscuído;
Só pelos dois podia ser enxergado,
Já que ninguém mais parecia notar
A alvíssima cegonha a lhes fitar.
Reconheceram-nos, cheios de emoção,
Como o bom e alegre santo, Cristóvão,
Que viera prestigiá-los secretamente
E abençoar-lhes o merecido casamento
Depois de tantas desgraças e sofrimento.
Alceste meneou-lhe a cabeça, sutilmente,
E a ave pareceu dar a ele e à garota
Uma breve piscadela marota.
IV
Logo, Alceste tornara-se conhecido
Por toda a cidade como um benfeitor;
Por onde passava era querido
E saudado com júbilo e fraterno amor.
As obras de sua ordem oculta retomara
E em seriedade as redobrara,
Pois seu ânimo havia recuperado
Com os bons Dalia e Martynas a seu lado.
Todos aqueles que de ajuda precisavam
Eram sempre atendidos com presteza,
E com o máximo possível de gentileza,
E nas ruas de Vilnius todos afirmavam
Que na Terra lar mais feliz não existia
Que o de Martynas, Alceste e Dalia.
V
E não pensem que nosso herói se esquecera
Da promessa, guardada em seu coração,
Que a seu velho falecido mentor fizera!
Assim que encontrou a ocasião,
Uma última viagem realizou
(E Dalia, é claro, o acompanhou)
Ao país onde havia nascido
E tão desconsolado havia sido,
A fim da arruinada capela visitar
E contar ao velho, como prometera,
As várias aventuras que tivera.
E ficaram eles, por horas a falar,
Certos de que, em algum lugar, ele os ouvia
E orgulhoso de seu aluno se sentia.
VI
E assim nosso estimado herói viveu
Com quem o amava, alegremente,
Pelo resto dos dias que Deus lhe deu,
Até que chegou a hora, finalmente,
De sua alma aos Céus entregar
E aos que o precederam na Ordem se juntar.
Dalia seguiu-o um pouquinho depois,
E, unidos, foram sepultados os dois
Sob uma bela lápide gravada
Com todos os belos feitos de bondade,
Para que, no futuro, pela posteridade
Fosse com admiração contemplada
E soubessem que jamais existiria
Outro casal feito Alceste e sua Dalia.
VII
E este conto aproxima-se do final,
Mas para mostrar-vos que sou consciente,
Vos deixo com uma lição de moral,
Pois todo autor considerado "decente"
Quer a seus leitores algo passar,
E algum útil aforismo lhes ensinar.
Portanto, se algum de vós estiver
Como meu dileto Alceste a sofrer
E o suicídio estiver cogitando,
Pense que, se tirar a própria vida,
Terás a tua oportunidade perdida
De um herói como ele acabares te tornando!
A roda da fortuna gira, inabalável –
Espere, e um dia lhe será favorável.
VIII
Tendo o drama agora findado
E após cada um de seus atores fielmente
Ter seu respectivo papel desempenhado,
Calam-se todas as vozes em minha mente
E vão todas descansar em minha memória,
Agora que ganharam a sua história.
E sou grato a ti, leitor, meu amigo,
Por chegares ao fim da empreitada comigo.
Espero, de todo o meu coração,
Que meu conto, apesar de suas imperfeições
(E, admito, alguns plágios e imitações),
Tenha o proporcionado alguma diversão
E até mesmo um pouco de esquecimento
Da corrida vida neste mundo cinzento.
IX
A aqueles que não vieram a gostar
De minha história, é com muita sinceridade
Que venho a todos vós me desculpar;
Reconheço, com o máximo de humildade,
Que agradar a gregos e a troianos,
Desde o começo, nunca esteve em meus planos –
Só queria entreter-vos contando um conto
E, assim, como dizem, aumentar um ponto.
Mas não o insultem demasiado cruelmente!
Sou um pobre-diabo, sem mais nada a oferecer;
Criar histórias é só o que sei fazer.
A qualquer má-língua respondo somente:
"Criticas a casa que fiz com meu dinheiro?
Mostrai-me a que fizeste com o teu primeiro!"
X
E agora que disse o que queria dizer,
Dou a cada um de vós até loguinho,
E espero que um dia possamos nos rever
A fim de degustarmos aquele vinho!
Este, pois, será o único preço
Que lhes cobrarei pelo vosso apreço:
Venha, meu leitor, em breve me visitar,
E iremos alegremente brindar!
Um agradável serão passaremos
E talvez outras histórias lhe contarei…
Pacientemente, a esperar, aqui estarei
Por este dia em que nos reencontraremos –
Até lá, que São Cristóvão e o bom Deus
Abençoem e guardem a vós todos! Adeus!