Enterro às Quatro da Tarde
Nada como acordar após a morte
Pois disse o sábio
“Convém a vontade de sentir
E por esse mundo ir
Sem paz
Sem descanso”
E aqui me vejo
Sendo enterrado às quatro da tarde
E sem nada poder fazer
Observando meu corpo que se decompõem
Vejo o sangue que instalou para baixo
E os algodões em minha boca e nariz
Morto como qualquer um
Apenas uma alma perdida
Me colocam, então, dentro do buraco
E vejo suas expressões apáticas
De como se enterra uma semente
A terra cai por cima de mim
E bate na madeira
Criando um som parecido com o de um tambor
A rufar pelos confins desse mundo
Ó, mundo maldito
Que tanto me fez sofrer
Hoje saio dele
E, enquanto minha alma é punida
Observo a decomposição da matéria
E o odor fétido do desprezo
Oh, não mais escuto seus passos
Foram todos embora?
Eu sei que todos eles sabem
Você quer saber também?
Pois saiba que dei cabo de minha vida
Numa árvore qualquer
Ao lado de um campo cinzento
Observando a paisagem
E hoje, morto
Cumpro a passagem
E meu ser é punido
Enquanto me enterro às quatro da tarde