Enterrado

Há uma música triste tocando no rádio

Ou talvez seja só o eco do meu coração

Afinal, acabei de enterrar viva

A única pessoa a quem já amei

Amaldiçoei a mim mesma à solidão

Mas pelo menos é melhor que continuar implorando

Por um amor que jamais será meu

Já não consigo chorar por você

Minhas mãos estão frias

Mas sinto minhas bochechas rosadas

É estranhamente reconfortante

Observar enquanto a terra cobre seu corpo de desespero

É estranhamente libertador

Saber que, desa vez, nunca mais vai voltar

Sempre fui melhor em odiar do que em amar

E ironicamente

Você nunca foi bom em qualquer dos dois

Ao menos não poderá mais manipular ninguém

A sete palmos debaixo da terra

E eu vou me vestir de preto hoje

Porque serei a única a presenciar seu enterro

Porque serei a única a acompanhar

O último dia de escuridão que se esvai

E amanhã, quando o sol nascer

E você estiver enterrado num caixão qualquer

Sob lápide nenhuma

Colocarei meu vestido branco

E me casarei com a vida

Me casarei com a vida que traí por você

Reatarei a amizade com a felicidade

Que me abandonou por ter ciúmes de você

Colocarei meu vestido branco

E dançarei de mãos dadas com o sol

Sobre um campo florido

E ninguém lhe levará flores

Serei finalmente feliz e, caso chova

Será apenas para formar um arco-íris

Iluminando o mundo com as cores que nunca mais verá

E se eu tiver que morrer

Se eu tiver que morrer só

Aceitarei meu destino

Porque enquanto seu corpo frio apodrece na escuridão

O sol sorrirá para mim e me dará um último beijo de adeus