UM GRITO NA MULTIDÃO 17 DE ABRIL
Um Grito na Multidão 17 de Abril
Paira sobre a Bíblia um grande desespero: o homem filho de Deus pecou.
Paira sobre a psicologia um grande desespero: o homem não passa de um ser psicossomático.
Paira sobre a Constituição um grande desespero: o homem não é livre.
Paira sobre a sociedade um grande desespero: o homem não passa de um produto do meio.
A minha poesia é espinha de peixe atravessada na garganta da hipocrisia.
É sangue caboclo, açaí de mim.
Um grito na multidão 17 de abril: 19 sem terra, mortos impunemente pela milícia de Almir Gabriel, curva do “S”, Parauapebas-Pará.
Versos in versos
Pulso constante de uma lista fúnebre.
Raças imundas!
Vermes nocivos!
Cruéis carrascos dos oprimidos!
Tantos necessitam de pão, não tem,
Tantos necessitam de terra, não tem,
Tantos necessitam de justiça e não tem.
Fardo pesado,
Busca incansável,
Lágrimas de sangue,
Mãos bruscamente calejadas,
Sonhos sofridos.
Erguem-se os estandartes esperançosos!
Levantam-se os mártires marcos de lembranças!
Lembranças contadas, faladas
Lembranças escritas, riscadas
Lembranças contadas, entoadas
Lembranças pintadas, pichadas
Lembranças sofridas, gritadas.
Sol a sol, dia a dia, gota a gota, sonho a sonho.
Chapéu na cabeça, facão na mão, pés descalços
Pulsa um coração gritando bem alto: cadê a justiça para o meu irmão!?
Enquanto muitos têm o que comer, onde dormir
Sem se preocupar com o oprimido
Ele, o oprimido, já não tem comida, justiça, acolhida, terrinha
Dormida, hortinha, calçado, direção, relógio ou um celular na mão.
Ele só tem coragem, enxada, facão, mãos calejadas
Um coração sofrido, sede, fome, injustiça, filhos e mulher que tanto sente saudade.
Eis um grito na multidão!
Avançando rumo aos portões dos lobos de paletós e gravatas.
Um grito que cala!
Abafado por sete palmos de terra que tanto almejava.
Eis um grito na multidão!
SINQUÊ DE MELLO,
17 DE ABRIL DE 2001,
BELÉM-PARÁ.
Do livro POEMAS VERMELHOS.