Os tristes olhos (um pesar sobre Chernobyl)
Aqueles velhos dias de momentos frágeis
Vem retornando aos poucos em passos ágeis
Os tristes olhos que contemplam a cidade
Novamente estão vermelhos
Novamente lamentam o mundo que em volta morre
Em lágrimas de uma chuva quente
Em desilusão de uma mágoa cruel e fervente
O gosto de ferro na boca
A garoa invisível na face fria
Tudo caiu como bomba naqueles dias
Tão velhos e tão brutos.
Nunca compreendidos como deveriam
Tão tristes e tão sem motivo
Nunca entendi como aqueles dias passaram
E agora, como em todo ano comum,
A dor daqueles momentos vem nos assombrar
E nos lembrar que no final
Por mais fortes que sejamos
Nós somos sempre vulneráveis as nossas próprias ações
Os tristes olhos que observam a cidade
Hoje não sabem por qual motivo choram
Se por alívio de sobreviver
Ou por medo de continuar vivendo
Cada nova hora nas noites do gélido inverno de Kiev
Aquelas sombras voltam
E espalham-se em um mar de pensamentos
E perguntas sem nenhuma resposta
De quem é a culpa afinal?
Dos homens que erram?
Ou da sociedade que os ensina a errar?
A cada novo dia renasce a luta
Para que a esperança não morra
Através dos tristes olhos de quem estava lá
Que hoje contemplam os corredores e caminhos vazios de Pripiat
As eternas sombras daqueles dias voltam
Em marés invisíveis de recordações e dores
Naquele incomum abril de 1986
Quando o mundo assistiu sua própria sentença de morte
Naqueles intermináveis segundos mudos
De perplexidade afogada
Em uma nuvem de incertezas
Quantos mais ainda têm que morrer em nome de alguns poucos patrimônios?
O final da história ainda permanece obscuro em algum lugar
Tudo se passou naqueles dias quando meus olhos deixaram de viver os sonhos
Que um dia sempre desejei poder sonhar