Desconexão
A vezes sou acometido por uma sensação
de que a vida não me pertence,
pertence a estranhos, não a mim.
Vivo pelo olhar e gestos alheios,
e da representação que eles têm de mim.
Vivo a mercê de seus humores,
gestos largos ou pequenos.
Nestes dias, tenho pensado nisso,
quando estava com um caniço a pescar minhas lembranças.
Eram lembranças de terceiros,
sensações movidas por atitudes de desconhecidos,
comportamentos estimulados por influências externas.
Ódio e ressentimentos fomentados por preconceitos,
tudo encrustado em mim.
Como sou influenciável,
com reboliço, meu coração estremece de pensar nisso,
de saber que minha vida é dirigida por forças externas.
A vida que é minha ainda está por ser descoberta,
mas como serei eu,
se em mim pulsa o sentimento de pessoas distantes,
o sangue de ancestrais, a memória de gerações passadas?
A cara que é refletida no espelho
não corresponde à minha,
é um ser completamente estranho,
híbrido, um animal,
um bicho, um pássaro, um lobo, um gato, um cão,
só sei que tem 7 orifícios.
Socorro!
Esse não sou eu!
Sou um estranho,
um desconectado de mim mesmo.
E isso não se reduz à questão de gênero,
credo ou raça,
é de estranhamento,
é o não pertencimento a mim mesmo,
não sei ao certo quem sou,
e isto é apenas uma constatação