UM SALTO PARA A INEXISTÊNCIA
NOTA: sinto um certo pesar em publicar este texto, pós dia, no mês internacional da mulher. Mas o meu projeto como escritor desde 2022 é UM POEMA PARA CADA MÊS. Assim, o deste mês é este. Infelizmente a homenagem às mulheres nesse dia foi por causa de uma tragédia histórica. Que o reconhecimento, o respeito, a consideração e a admiração também não precise ser. Meu máximo respeito a todas!
Do alto do estaiado ela contemplava a Brasil
Estações pintadas e novos articulados,
O viaduto grafitado, limpo, admirado, inaugurado
Congratulados o militar e o civil
Porém, eles continuam famintos, entorpecidos e rejeitados
Dormem sobre pedras pontiagudas
Num quintal medonho, em “casa” que não se aluga
E no comércio local ninguém compra orgulhos roubados
Ela gritou: basta! Basta! Não judiem mais de nós.
Parecia noiada como nunca esteve antes
(Bêbada ou drogada) chapada o bastante
Desatando da garganta todos os nós
Ela berrou: deem-nos, ao menos, um cobertor e façam uma reza
Há quem nunca experimentou um abraço quente
Apenas olhares frios, sorrisos vazios e ilusórios entorpecentes
Façam-nos uma gentileza, pois, a gente mesma se despreza
Ela bradou: ‘eu queria saber ler e escrever,
eu gostaria de nunca ter roubado ninguém,
eu ressuscitaria todos os amigos que eu vi morrer,
eu adoraria deixar bons exemplos para alguém.”
Mas ela só aprendeu, com a vida, a sobreviver
Desde que foi encontrada recém-nascida no asfalto
A resiliência não encontrou guarida em seu ser
E sua existência se encerrou num salto.
Um salto para a inexistência!