João de Barro
Qual é a graça da desgraça?
Por onde andam os valores que não estão na praça?
Não sei onde eu estou ou estava.
Isso me deixa sem palavra.
Em meio a essa safra
Eu não sei o que se safa.
A vida vive por um fio
Derretendo no calor do mundo frio,
Definhando e causando calafrio,
Enchendo o mar e esvaziando o vazio.
O que é a minha vida diante do diamante?
De amante da vida não há nada
Nos que surfam na onda dominante.
A minha vida não passa de uma escada.
Uma escada descartável
Sem nenhuma chance de ser reciclável.
Até a garça ri da raça
Voando perdida.
Até a garça acha graça
Da vida derretida, sumida na fumaça.
Qual passarinho passaria fome
Vigiando a comida de quem come?
Pobre João de Barro, obedece sem ser obedecido,
Esquece que é esquecido e constrói sendo destruído.
Ele sabe que foi jogado para escanteio.
Ele sabe que pra ele o negócio está feio.
Mas esgotado, bico calado, nada de freio.
E nesse estado, nesse cercado,
Se frear será esmagado.
Assim, sem nenhum movimento,
O produtivo animal se transforma em um instrumento.
Uma ferramenta, uma escada, um lombo de jumento,
Um ponto para um pronto atendimento.
O João de Barro sempre paga o pato.
O João de Barro não sabe beliscar o prato.
Só sabe beliscar o prato quem não paga o pato.
Oh Pai! Se eu vir os bichos no pulo do gato ficarei grato.
Dessa força que a gente bota, brota o que a gente quer.
Se a gente se junta quem sabe assunta e de repente bate o pé.