ânsia
A jovem meretriz passava baton em público
E então, vermelho berrante era consumido pelos olhos arredores
Fechava o espelhinho
Acertava os cantos da boca
E quase uma palavra lhe saltava da boca,
Uma blasfêmia,
Heresia ou chiste.
Na outra mesa, uma senhora de aproximados
Quarenta anos postada diante de uma cerveja
Olhos desesperançados...
Fadiga evidente
Mãos calejadas
Perto da boca, só suspiro...
Lá veio o devaneio a pensar na mocidade,
Ah! Tempos idos, muitos idos
E de tão idos, já findos
E que deixam saudades ou remorsos.
Havia entre essas duas mesas
Enorme abismo
Redemoinho revolto.
Mar e quebra-mar
Cais sem volta e nem partida.
A jovem meretriz arruma companhia
Arrasta-se a cadeira em sua mesa,
E então, o vermelho alegre de seus lábios
Adiantam-se em sorrisos.
A balzaca termina a cerveja.
Paga imediatamente e levanta-se
Em rumo incerto.
Das dores cotidianas.
Da fadiga constante.
Nos olhos marejados de reticências
Diz arrevoir para a jovem meretriz.
Lamenta por sua sorte.
Engole a seco na garganta molhada.
E segue, írrita.
Como um soldado para o combate.
Prosseguirá os anos a passar.
A jovem deixará de ser tão bela e
admirável.
Mas o tom rouge dos lábios mundanos
Fatalmente inscreverá
secretamente nos passantes,
na paisagem
um desejo maior que a palavra.
A ânsia da sedução.