Negres
negros
de brancos
dentes
e sorrisos
fáceis
tocadores
de piano
são mestres
enganadores
da tristeza
negras
de beleza
rasurada
a carvão
pelas alvas
luzes
luzólhos
azuis
sangues
azuis
negros
motores
do labor
emprestam
seus corpos
aos usos
gerais
doutorandos
da eterna
servidão
negras
dignidades
devastadas
arrastadas
pelo asfalto
a toque
de caixa
eia pois
temos aqui
as culpadas
negros
filhos
da noite
famintos
de cintos
apertados
nascidos
suspeitos
sem sortes
nem jeitos
negras
lágrimas
borram
os autos da
história
de embustes
notáveis
grafados
em arcaicas
obras
negros
matados
no cerne
das peças
teatrais
e rotineiras
condoreiras
tragédias
em brancas
nuvens
negras
raras
pouco
santificadas
e sem céu
cristão
o galardão
do descanso
não alcança
as flageladas
/// A poesia foi escrita em homenagem à atriz, professora e pesquisadora em Teatros Negros, Isabel Oliveira, vitimada por uma perseguição ostensiva de um segurança enquanto fazia compras no supermercado (Carrefour), conhecido por reiterados casos de racismo. Sua brava atitude: ficar apenas em trajes sumários dentro do estabelecimento como forma de protesto. Força e axé na sua luta, Isabel. Você não está sozinha. Você representa mais de 56% das pessoas pretas e pardas que vivem neste país. Nunca mais seremos silenciados. Axé! ///