REFLEXÕES NO BANHO
Meu corpo é como uma panela
Daquelas mais caras pouca coisa
A panela foi o presente que ganhei da minha mãe no dia em que fui morar sozinha
Ela serve para preparar os alimentos que me mantém viva
Mas não tudo
Porque existem alimentos cujo preparo dispensa cozimento
Desde pequena me ensinaram que preciso cuidar bem da panela
Preciso mantê-la limpa por dentro e por fora
Para não correr o risco de ter o alimento contaminado pela presença de substâncias estranhas
Substâncias que se instalam e se reproduzem em panelas malcuidadas.
Embora eu tenha tentado cuidar dela
A panela começou a dar sinais de envelhecimento
Os sinais surgiram mais rapidamente
E se tornaram mais visíveis
E ficaram mais incrustrados
Na parte externa.
Por mais que eu tenha tentado cuidar bem da panela
(Sem excesso porque sou uma cuidadora um tanto incompetente)
Por mais que tenha tentado me lembrar de manter o fogo na temperatura ideal
Por mais que eu tenha tentado evitar a preparação de substâncias que podem acelerar o envelhecimento
Ou danificar o material de que a panela é feita
Os sinais de envelhecimento começaram a tomar conta do interior da panela
E chegou um tempo em que ela não podia mais ser confundida com uma nova
Nem mesmo pelos olhares mais distraídos.
Talvez porque a panela não foi escolhida por mim
A verdade é que nunca gostei muito dela
E fui gostando menos e menos ainda com o passar do tempo
Até que deixei de gostar
Completamente.
Mas fico com esta mesmo
Porque não gosto dela mas também não a odeio
E porque não tenho outra.
A maior diferença entre meu corpo e a panela
É que eu posso jogar a panela velha fora e comprar uma nova
Já esse corpo...