A peste
"Enquanto uma peste alastrava-se e drenava todo e qualquer rubor sanguíneo da população, os governantes vampirescos se juntavam em um ritual que sacrificava consciências e sacralizava preconceitos no púlpito da morte."
Quando em meio a uma hemorragia,
o horror ao próprio sangue impera, o indivíduo se entrega ao completo esvaziamento de si.
O vermelho escarlate escorre das chagas históricas, escorre das feridas, esvazia os corpos e agoniza minorias às margens da bandeira.
Ah, quem irá estanca-lo? Se o próprio povo permite ser sugado?
Da democracia já não se espera muito, pobre mulher sequestrada, paralítica e condicionada a encerrar seus filhos logo após pari-los.
A crise a fez gerar uma criatura que se voltou contra a própria mãe; um Frankenstein cuja anatomia pútrida deu voz a uma radicalidade adulterada.
E há de me perguntar aonde anda a ciência em meio a tal criação?
"A ciência anda trôpega por entre
a multidão acoplada no obscurantismo.
A ciência empurra os corpos,
movimenta a vida, testifica a liberdade e comprova o olhar.
A ciência anda sob os métodos,
e se aperta entre o povo para
mostrar-se despida;
E ela caminha sem pedir licença; oferece tuas ferramentas, mas ninguém a vê.
A multidão quando a observa, a espanca e conspira teu corpo. Lá vai a ciência sangrando nua, enevoada pelo negacionismo."
A criatura nefasta alimenta-se da revolta e da agressão a ciência. A criatura anda costurada como um feixe a suprimir seus membros em um organismo de forças contrárias.
Mesmo que a bandeira as tampe, com o tempo as cicatrizes se mostram realçadas.
Verás que a pluraridade de um país jamais caberá em um partido sem que seus membros sejam partidos.
No chão a criatura se contorce em epilepsia, e de sua carcaça nasce o poder popular.
- Letícia Sales
Instagram literário: @hecate533