E o Povo Explorado Aprendeu o seu Ofício
O ditador de quase todos detém poder demais;
Possui opositores acovardados, togados acanalhados,
Riquezas surrupiadas, direitos dos desdentados achincalhados,
Domina gados humanos, meros defecadores que aplaudem,
Mas o desgraçado não está satisfeito, deseja muito mais.
Na alta noite da dor, na descoesão social, entretanto,
Os invisíveis nos noticiários, o povo, tratado como polvo,
Em seus pedaços de vidas roídas, malsucedidas, tomaram consciência
Da crise, do bagaço moído feito cana estragada que vivem...
E invadiram o palácio – fizeram voar pela janela os serviçais,
Tacaram fogo nas ruas, pintaram de greve as horas seguintes,
Perante a Lei e os bons costumes juraram a redenção da classe trabalhadora:
De pé as vítimas da fome, todas as bocas regurgitando os seus grilhões.
Depois de sonolentos anos, de cegueira política, eles renegaram altares,
Cuspiram no moralismo de fachada e capturaram o ditador:
Abriram seu estômago em praça pública, seu pútrido sangue escorreu ao redor,
O ressabiado conformismo se transformou em eloquente revolta.
E o povo explorado aprendeu o seu ofício:
Por entre as trevas tomadas no poder insistir em tomar as rédeas.
Ter a certeza que mesmo quase eterno todo déspota causará
Tanta podridão às cabeças dos humildes, que, uma hora,
Quando menos se espera, os humilhados reduzem tal verme
A um amontoado de ossaturas e um punhado de sangue seco.