(Sobre) Vivência
Cedo da manhã,
guiado por sua sina involuntária,
sufocado, num ônibus lotado,
ele sonhava acordado.
Seus olhos já imaginavam o almoço,
que talvez ele nem comeria.
Ao meio-dia, frente a um prato de sobras,
pensava nos minutos finais do intervalo,
os quais consumiam seu cérebro.
Ao seu trabalho a tempo retornaria?
Ao fim da tarde, sua coluna doía
e clamava por seu travesseiro macio.
Suas mãos já não mais o obedeciam.
Tarde da noite, em sua cama, seu corpo jazia;
mas sua mente em provocá-lo insistia:
sonhava com o ônibus lotado do outro dia.
Ao seu lado e de toda sua descortesia,
amparada por um travesseiro terno,
repousava sua esposa vazia.
No quarto à frente, sem um abraço do pai,
Sob o cobertor do abandono,
seu filho mais uma vez dormia.